Amor e sexo
Por que será que a gente valoriza exageradamente o aspecto humano
mais simples e natural que existe? Por que será que discutimos
tanto sobre ele e mergulhamos em elucubrações profundas,
apuramos nossos ouvidos nos seminários, nos descabelamos em
séculos de psicanálise, subimos torres, descemos poços,
inventamos milhares de estratagemas, colamos rótulos, montamos
armadilhas pretensamente perfeitas, matamos frangos nas macumbas das
nossas esquinas, treinamos olhares perfurantes, usamos perfumes embriagantes,
competimos e exibimos malabarísticas posições nos
cansados colchões?
Por que desde a primeira caverna nós resolvemos complicar o
impulso mais instintivo que trouxemos e que deveria ser totalmente
espontâneo para que realmente pudesse Ser? Sexo por amor? Apenas
por desejo físico? Por paixão? Sexo por correspondência,
atualmente pela internet? Interessa isso?
Sei lá...sexo deveria ser só sexo, sem nossas eternas
interpretações, sem conceitos que pudessem desviar a energia
do fluir. Mas a gente complica, a gente jamais se basta na água
que jorra da fonte. A gente não aceita o prazer pelo prazer
sem que a mente dê seus apitos estridentes. Seria prêmio demais
para simples humanos né? A gente não tem muita garra para
ser feliz livremente, temos que sofrer nem que seja só um
pouquinho.
A matusalênica sentença: "tudo tem seu preço"...que
droga de carimbo engolimos a seco!
Dificuldade sexual e escolha de parceiro é manchete de jornal,
furo de reportagem, antes mesmo da bíblia ser lançada. Precisamos
complicar, estamos no fogo cruzado. Precisamos saber se os famosos
"os outros" aceitam a nossa forma de encarar o sexo, se eles nos
apoiam, se acham que "fazemos" direitinho, se não estamos ofendendo
os princípios morais estipulados pelos cínicos. Precisamos
também saber se atraímos o suficiente o nosso parceiro, se
estamos acompanhando a moda do momento, se "fica bem isso", se "cai mal
aquilo", se vão achar que a gente é uma boa merda na cama,
ou se somos gostosérrimos.
Aí a gente passa a pesar e a medir todos os gestos. Fêmea
deve ter tal comportamento para acender os desejos do macho. Macho
tem que ser do jeitinho certo para acordar o tesão da fêmea.
Aí a gente se perde, é muito complicado! Será que
estou agindo certo? Mulher pode fazer desse jeito? Homem gosta assim? Homem
pode ser assado? Mulher sente atração dessa maneira? E se
eu for homem e me apaixonar por outro, pode? E se eu for mulher e sentir
um lindo amor por outra, vou ser crucificada por mim mesma?
Vamos então para as universidades, lemos bibliotecas de conselho.
Vamos para os consultórios, somos electras e édipos ao lado
de papai Freud, conversamos com as maravilhosas panelas junguianas, evoluimos
e regredimos diante de infinitas linhas analíticas. Usamos caldeirões
de magias, queremos descobrir o método infalível, colecionamos
tabus e arrasamos com o nosso mais puro e belo presente: o sexo e o amor
espontâneo, seja como for, por quem for, do jeito que brota, sem
olhar data de fabricação ou tempo de validade.
Será que seremos gente assim algum dia?
Quero um ET que nos abrace em Tantra, que jogue pó de pirlimpimpim
nas cabeças exaustas e cale essas nossas mentes indecentes, ultrajantes,
prepotentes. Quero um ET, que nos ensine a lamber o quente do Sol, que
faça-nos pertencentes à transparência da Lua e não
nos permita mais invadir as alquimias dos anjos indevassáveis. Quero
o amor sem planos, sem metas, sem passeatas pelas ruas asfaltadas de hipocrisias.
Não quero mais os guinchos dos nossos egos inflados, cobertos de
sapiência tola, gordurosos em suas pesquisas arcaicas. Quero o deus
de verdade que só pode Ser enquanto formos simples expressões
suas, amantes do fogo interno, escafandristas do azul sem explicações.
Quem sabe um dia aprendemos a amar e a manifestar amor e sexo sem dogmas, sem escolhas que não sejam apenas as que nascem dos nossos mais verdadeiros instintos, sem o monte de lixo intelectual que empilhamos nas margens das nossas estradas, fazendo um peso tão injusto, afogando nossos mestres corações? Quem sabe?