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SALSICHA

A minha casa é uma casa que eu gosto. É aquilo que chamamos de lar. Uma  fruteira com frutas, uma geladeira com algumas gulodices, um relógio antigo  na parede, um marido assistindo futebol na tv e uma filha brincando de  Barbie.Quando chega a noite, eles me perguntam:
- Dá pra sair um ranguinho?
Vou, então, até a cozinha, abro a geladeira e fico ali, me refrescando do calor e pensando no que vou preparar.
- Eu!!!! disse a salsicha.
- O que? Você não fala, cala a boca sua...
- Salsicha!!
- Saúde!
- Mas eu não espirrei! Só estava tentando ser gentil.
- Se quer ser gentil, então se comporte como uma Salsicha!!!
- Saúde!
- Você é uma enlatada insolente!!
- Desculpe, mas faz duas semanas que eu estou do lado dessa salsinha   fofoqueira. Já sei da vida da geladeira inteira.
- É só não perguntar.
- Mas eu não pergunto, ela é que força a barra. Outro dia me contou   que a festa do xuxu deu o maior pepino.
- Ah é? Por que??
- Tá vendo...você também quer saber. Não dá pra resistir.
- Olha aqui, eu não quero saber de nada, sua salsicha alcoviteira.
- Nem da minha prima?
- Que prima?
- A lingüiça. O regime das sete luas deixou ela magra que nem tripa.
- Não quero saber nem de salsicha, nem de lingüiça, nem de coisa nenhuma. E quer saber? Essa conversa já tá muito comprida.
- Comprida? Como é que você descobriu?
- Descobri o que?
- O meu apelido aqui no pedaço.
- Eu vou fechar a geladeira...
- Se você fizer isso vai ficar com dor na consciência.
- E por que eu ficaria?
- Ninguém abandona uma salsicha à sua própria sorte e sai de consciência   tranqüila.
- Você tá fazendo chantagem emocional. Isso é sujeira.
- Sujeira tá a gaveta das hortaliças. Tá um fedô aqui que ninguém   aguenta.
- Mas eu limpei semana passada!!
- Então deve ser da baba do quiabo. É que ele tá de olho na beterraba.
- Já te disse que não quero saber de fofoca. Vocês que são brancos, vocês   que se entendam.
- Brancos coisa nenhuma, a beterraba tá roxa de raiva. A coitadinha deve satisfações ao inhame.
- Chega!!!!! Você passou dos limites. Era só o que me faltava, bater boca com uma salsicha.
- Seria melhor bater a boca na salsicha. Já imaginou?
- O que?
- Bem quentinha, com pão na chapa e catchup?
- Ok, você venceu. Vou fazer cachorro quente.
- Um último pedido...
- O que foi agora?
- Dá pra levar a ervilha???
- Pra que?
- Pra dar um passeio. Ela ainda é vagem. Nunca abriu a casca.

Thais Helena Fantauzzi


 


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