O Padre
Às quartas-feiras,
me olhava com cara de quem comeu e não gostou, e suspirando indignado,
me abria a porta do confessionário, antecipando-me as penitências,
todas elas, bem maiores que os pecados que eu confessava ter. Com olhos
de desprezo me olhava, como se fosse eu uma pintura mal-acabada de Maria,
a Madalena, que não tem cura e não se emenda, mariposa de
noites sujas, pela indecência das ruas, iluminada.
Com voz de culpa me falava,
sentindo-se por mim ofendido, "sujeita ousada", que desrespeitando-lhe
o rebanho, fazia barulho com os saltos e sob atransparência do vestido,
convidava ao pecado.
Podia sentir-lhe a respiração
pesada, através da treliça que nos separava,recriminando-me
a invasão da hora Sagrada, quando uma multidão de ovelhas
carcomidas, silenciosamente desfiavam nas contas do Rosário; suas
preces e ladainhas.
Mesmo assim, continuava
me abrindo a porta, às quartas, hora da Ave-Maria e em todas as
despedidas — enojado — dizia:
— Vá e não
peques mais!
A isso eu não respondia,
só ria um riso escondido, que não era de pilhéria,
era mais um sorriso frouxo de quem colheu o que plantou!