CIDADES BRASILEIRAS
OLINDA REVISITED

Poucas cidades ainda
(sem falar nas igrejas
e úteros matriarcais
e bacias maternas)
podem dar a quem passa
a intimidade aquela
de quem vive uma casa
como outra matriz terna,
habitando paredes,
chãos de tijolo, telhas,
rebocos que respiram
anchuras, estreitezas,
mais a porosidade
das quartinhas de terra
que à água dão o gosto
do barro que nos era.
De fora de uma casa
de uma cidade dessas,
o estranho-de-mais-longe
sente a morna franqueza
que expressa sua fachada
(mesmo quando se fecha).
Hoje-em-dia em Olinda,
e não só nas igrejas,
viver-se de alma e corpo,
se pode quem se veja:
se pode em qualquer casa
e contemplando-a apenas;
quem visita tal casa
não só passeia nela:
geralmente se casa
com ela, ou se amanceba.

                 João Cabral de Melo Neto

Do livro: Obra Completa, in A Escola das dacas [1975-1980], Nova Aguilar, 4ª reimpressão da 1ª ed., 2003, RJ

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