Lá quando em mim perder a humanidade
Mais um d'aquelles, que não fazem falta,
Verbi-gratia — o theologo, o peralta,
Algum duque, ou marquez, ou conde, ou frade:

Não quero funeral communidade,
Que engrole sub-venites em voz alta;
Pingados gatarrões, gente de malta,
Eu tambem vos dispenso a caridade:

Mas quando ferrugenta enchada idosa
Sepulchro me cavar em ermo outeiro,
Lavre-me este epitaphio mão piedosa:

"Aqui dorme Bocage, o putanheiro:
Passou vida folgada, e milagrosa;
Comeu, bebeu, fodeu sem ter dinheiro."

      Manuel Maria Barbosa du Bocage (1765-1805)

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Nota de Glauco Mattoso: Poema agrupado posteriormente e publicado em Poesias eroticas, burlescas e satyricas como Soneto II. Edições posteriores, tal como uma de 1969, atribuem apocrifamente a este poema o título Soneto do Epitáfio.
Fonte: http://www.elsonfroes.com.br/bocage.htm

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