CRIAÇÃO (Antes de nome)

Se você vai pela estrada distraído
não se esquece pelo menos da paisagem
ela penetra em nós pelos olhos pelos
poros, somos o que tocamos e nos toca.

Fazer arte é essa mesma displicência
não saber sabendo, criar de quase nada
e de tudo quanto fica de quanto passa.

O mundo só existe para ser criado.

Tinha uma pedra no meio do caminho
e muitas outras na beira do caminho
tinha muitos espinhos dentro do corpo
doendo pedindo para ser cantados.

O conhecimento se dá por acaso
quando a imagem grita por um corpo.
 

                               ***

A relva recobre o chão e viver é tão grande.

O peixe me revela a cor das coisas.

Sou a semente plantada na terra
vejo na enxada o nome do universo
vejo no canto do pássaro a alegria.

A música das águas abraça as árvores
margaridas dançarinas cantarolam na luz
um cavalo alazão relincha na invernada.

São meus os horizontes das palmeiras
tenho raízes e a infância grita no mato
tenho estrume nas botas e grito para o dia.

A cobra percorre o caminho da roça
pincel do lagarto colore a paisagem.

O pólen da beleza desenha a vida.
 
                               ***

Eu não conheço o nome de nada nem de ninguém.

Quando fomos pescar à beira do grande rio
eu fiquei a um canto contemplando a paisagem
e a paisagem passava e passava alheia a tudo.

Eu não conhecia o nome de nada a minha volta
eu via a paisagem e nada mais me interessava.

Ver era tudo para mim e não tinha nome
a beleza era um ser em si, sem atributos.

Você tem um peixe na mão e me pergunta
“que peixe é esse?” e eu só sei que o peixe
é belo e é livre mesmo agora fisgado no anzol.

Antes de nome vem a cor vem essa essência
que palavra não define e é música em suma.

O que permanece do peixe é a paisagem da cor.
 

                                              José Carlos Mendes Brandão

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