PREFÁCIO
Saciedade dos Poetas Vivos Digital nº 9 versa e verseja sobre as QUATRO ESTAÇÕES
– os ciclos da natureza e/ou a comparação deles com as fases humanas: o começo (aflorar/desabrochar), o auge (a expansão e o climax), o declínio (ocaso/reflexão) e o fim (frieza/tristeza) de uma paixão, de um sentimento intenso. Cada uma, em separado, narra um capítulo; juntas, retratam às vezes uma vida inteira, em uma espécie de cena contínua de uma obra aberta, de um work in progress. A idéia de desenvolvermos esta temática surgiu através de uma pesquisa que realizamos há algum tempo sobre Vivaldi. O compositor d' As Quatro Estações
– sua obra mais famosa
– expressa musicalmente os fenômenos da natureza e/ou os períodos sentimentais a eles metaforicamente equiparados: o eclodir/agir do primeiro impulso, a alegria-plenitude, a dúvida/reflexão e o término de uma relação afetiva. Nasceu portanto da música a poesia deste volume.
Em todas as artes, as estações sempre despertaram obras maravilhosas; na poesia elas apareceram milnearmente nos kigos, que são o pilar das construções dos haicais tradicionais, e que se constituem por uma palavra ou expressão que sugere uma estação ou época do ano. Escreve Teliti Suzuki, Conselheiro do Centro de Estudos Japoneses da USP, no prefácio do livro "Natureza - berço do haicai - Kigologia e Antologia", organizado por H. Masuda Goga e Teruko Oda (1996):
O preceito budista de que tudo neste mundo é transitório aparece na literatura japonesa desde seus primórdios, mais exatamente, na primeira antologia poética compilada no século VIII.
Nos versos encadeados (renga e haikai renga), essa transitoriedade é expressa pelos kigo (termos de estação) que remetem às estações do ano ou a fenômenos sazonais e que devem constar obrigatoriamente da estrofe inicial do encadeamento, denominada hokku . Este hokku, por sua vez, passa a constituir um gênero independente a partir dos fins do século XVII, justamente quando o haikai renga da escola de Bashô se consolida com sua poética genuína.
Dia de primavera —
Os pardais no jardim
Tomam banho de areia.
Onitsura
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O rio de verão —
Que alegria atravessá-lo
De sandálias à mão.
Buson |
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Em qualquer lugar
Onde se deixem as coisas,
As sombras do outono.
Kyoshi |
Sem guarda-chuva
E sob a chuva de inverno —
Bem, bem!
Bashô |
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Contemplar a natureza sempre foi motivo de aprendizagem, reflexão e legado de experiências. Na nossa Saciedade dos PoetasiVivos, vol. 9, apresentamos o movimento das estações através de variadas propostas estéticas, na voz de dezessete poetas contemporâneos: Clevane Pessoa, Débora Siqueira Bueno, Dora Tavares, Jania Souza, Jaqueline Serávia, João Nilo, Márcia Sanchez Luz, Mariana Pinto, Pam Orbacam, Pedro Du Bois, Regina Vilarinhos, Sandra Fonseca, Sandra Souza, Sônia Adarias Soares Bruno, e dos nossos convidados especiais: Celso Gutfreind, Elisa Lucinda e Wilson Bueno (este último com um belíssimo repertório de rengas, nesta Antologia).
Cada vez mais as estações do ano - pela ação predatória do ser humano e os consequente efeitos de estufa, principalmente - estão diferentes e mesclados: temos primaveras invernosas, invernos quentes, verões outonais, outonos primaveris. Porém, como "nos terrenos terrenos/ nada é definitivo", como escreve Celso Gutfreind, que a poesia venha reestabelecer a certeza de mudanças e a plena vivência dos climas e estágios da vida, sob todas as suas variações de luz..
Urhacy Faustino e Leila Míccolis
EDITORES
Lançamento oficial: 13 de outubro de 2009
(Dia Mundial do Escritor)
Créditos:
Capa: Vande Rotta Gomide
Título: Eduardo Feijó Netto Machado
Seleção de textos: Leila Míccolis
Webmaster: Urhacy Faustino