Fazia anos que eu não visitava
a vilazinha onde nasci e aquelas
paragens todas a quem tanto amava...
Minhas Águas-Belas, tão humilde e boa,
com a sua igrejinha iluminada a velas.
Ali vi-me criança, outra vez, correndo
pela campina, olhando o prado em flor
e em tosco engenho a gotejar, moendo...
me vi menino e uma menina loura,
que fora, ó Deus, o meu primeiro amor!
Fui ver o “Tanque”, o poço onde eu nadava
tempo de inverno, arisco como um potro,
a ver se ali ainda eu me encontrava;
mas ao mirar-me nesse espelho de água,
já não vi meu rosto alegrem — um outro.
Também não vi aquelas coisas santas:
— rebanhos brancos a beber nos rios
que deslizavam ao longo das gargantas;
nem os velhinhos de cabeças brancas,
aos quais, a todos, lhes chamava tios.
Nem mansos bois a ruminar, tristonhos,
à sombra augusta de augustos juazeiros,
como quem cisma em inocentes sonhos...
Nem as siriemas de olhos amarelos,
cantando, longe, pelos tabuleiros.
Triste saudade amortalhou minha alma,
olhando a velha casa que foi nossa,
toda arruinada e como quem se ensealma...
Ó relembrança, foste uma fiala,
jorrando um vinho que, se amarga, adoça!...
Senti vontade de correr, gritando,
pelo rincão de minha peraltice
e a tudo, por ali, interrogando:
— Quem escondeu a minha mocidade?!
— Quem pôs tão longe a minha meninice?!
Do livro: "Iluminuras
da tarde", Ed. Blocos, 2001, RJ