Não, poesia não vende.
Ninguém mais vai pra Pasárgada,
nem põe flores no cemitério marinho.
A máquina do mundo encalhou nos olhos
azarentos do corvo. Nunca mais.
Não, poesia não. Livre-se.
Nem literatura, se quer saber. Tirando os
modernos monstros sagrados, o velho não
vai mais ao mar poluído e Moby Dick morreu na praia.
Auto-ajuda está em baixa. Avalanche de
de títulos, leitura de ônibus.
Conto, não. Pelamordedeus, conto é praga.
As palavras perderam o rumo no raso dos
aprofundados resenhistas. O mundo deles é
utopia entupida.
Professores sisudos reinam nos cadernos
de cultura semanais. Mas não vendem, não vendem.
O povo não está lendo. Tem três mil motivos (uma
edição!)
para não ler e um para ficar diante da tevê: os livros
são caros. Dois dedos sem prosa no controle-remoto.
Mas edições baratas estragam as vendas dos outros.
Afundam navios negreiros, abrem-se processos
contra o analfabetismo, berram articulados articulistas.
Nada acontece. Baratas lendo Kafka, Machado de
Assis plantando batatas, urublues sobrevivoejando
o inser-tão grande.
Não, poesia não vende.
Literatura não vende.
Estudos sociais encalham.
Beba e se mate, poeta.
Se enforque, contista.
Enlouqueça, romancista.
Tome teu próprio veneno, estudioso.
Do meu lado, Don Quixote, eu resisto
contra seus moinhos de vento artístico e não-fundamental.
Rui Werneck de Capistrano