Não sei, minha irmã, o que a vida ainda encerra.
Só sei que a sua passou, Cometa de Halley,
e já não há mais tempo pra voltar a vê-la
brilhante de esplendor no céu das madrugadas
como uma estrela ca(n)dente riscando o infinito
e caindo aos meus pés, sendo uma só comigo...
Sei que você as amava, por isso freqüentou
o Planetário da Gávea...
De um telescópio se munira,
dos livros de Carl Sagan,
da obstinação de Ronaldo Mourão,
(o poeta-físico mineiro),
e que votou, votou-se a um céu de Brigadeiro
condecorado, mas de outras estrelas...
E conhecia a vida de cada uma delas,
do terraço em que assestou sua máquina
na casinha de praia de Araruama City
e ali nos convidava
a longas digressões pelo seu céu com "habite-se"...
Sei que você foi uma delas,
cantando às Três Marias,
fazendo a quarta voz nessa ca(n)deia,
mas debruçada sobre anãs mais velhas,
Estrelítzia, quem sabe, em primavera aldeã
de prima-dona e musa dos jardins celestes...
Hoje resta tão pouco do que testemunhamos
brincando à sua roda nesse São João d' El-Rei,
Prados, de Minas, onde um sapo virou Príncipe
e encantado restou até que a morte os visse,
a enciumada, e o levasse consigo pra um jamais...
Hoje você retorna à sua primeira infância
cantando, anfitriã, como Ismália ou Ofélia
na torre de marfim em que isolou-se,
não por fugir de nós que a amamos como outrora,
mas por fatalidade ou predestinação
de novas trajetórias, a olho nu, invisíveis,
ou ao telescópio que por lá ficou...
Só mesmo Deus conhece o seu horóscopo,
sorrindo de sua louca astrologia,
astronomia, búzios, sincretismos...
Só Deus é testemunha desse abismo
que a separou de nós e ainda a mantém tão viva
entre desenhos, fotos, poemas infantis,
poesia-sofrimento, crônicas e críticas...
Ai dias preenchidos entre mestra e aprendiz
em performances maiores do que as lágrimas
regando sua passagem ensimesmada
como sombra benéfica e realíssima
de tudo o que restou e ainda finca
pé, num torrão dissipado de memórias...
Sempre viva, Celina, mesmo se a vida é morta!
Maria do Carmo Ferreira
(Niterói, 27.01.2001)
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N.A.: hoje Celina Ferreira, vivendo em Teresópolis
em companhia de sua filha caçula, genro e netos, assistida por médicos
&
psiquiatras competentes e amigos da famíla, completa
seus 62 anos e 4 meses de idade (Santana de Cataguases, 27.09.28).