APOLOGIA
Se é tua
a hora muda
em que não se canta;
se é tua
a brasa apagada
que mesmo assim queima;
se é tua
a hora cinzenta
pregada na janela,
costurada na menina cansada
do olho insone;
se és pura,
se és santa,
se és afinal burra:
perdoa.
Não venham
outros cafés tristes
pontuar tuas noites.
Não venha eu,
amarrotado,
trenoitado,
com aquele cheiro dela
em mim pegado
te matar aos pouquinhos;
nem venha eu virar teu câncer.
Perdoa e me larga,
perdoa e me deixa,
perdoa e te salva.
Mas se sou eu
que te salvo,
então perdoa e fica,
perdoa e esquece,
perdoa e me aquece
que eu passo muito frio,
eu passo muito susto,
eu preciso da tua asa
cortada
pra ficar debaixo
e não morrer.
Perdoa que eu
pela aí, se fico solto,
me mato.
Perdoa que eu,
nu, sou feio
e branco, e a lua
dá em mim com pena
do meu tamanho.
Perdoa que cada uma
é menos uma.
Perdoa que eu
estou me gastando.
Perdoa que eu estou
amando
com toda a pobreza
que um milhão de pais
desde Adão me deram.
Perdoa,
que eu estou no chão.
Orlando Tosetto Jr.
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