Sou da geração que foi criada para casar;
de véu, grinalda e flor de laranjeiras. Branca e virgem.
De preferência com homem correto
bem colocado e de primeiríssimas intenções.
Mas que culpa tenho eu, meu deus,
se veio Woodstock,
revolução sexual,
diotadura militar,
movimento hippie.
Tudo ao mesmo tempo.
Surtei, foi demais pra mim.
Conheci o Tavinho.
Fumei maconha,
transei LSD,
mudei pra Mauá.
Fui atrás do RÁ: Deus sol da expansão.
Casei grávida.
Aprendi tarô egípcio por correspondência
e fui tocando minha vida.
Mas criei meus filhos inteira, cresci com eles
ensinei o que podia
e se não sabia inventava.
Cursei pedagogia, 6 anos de análise yungiana
Fui dona de voutique.
Eu me permiti como ninguém se permitiu.
Hoje, ando mais velha e o tempo já se vê na cara.
Meu marido me deixou por outra.
Vinte anos mais nova e amiga da minha filha.
Em vez de tomar barbitúricos, fui ao esteticista,
comprei um creme a base de ácidos glicólicos
e entrei pra dança de salão.
Essa sou eu: me cuido!
As minhas mágoas
transcendome defendo como posso.
Eu sou libriana: agüento!
Pra sobreviver, eu canto,
faço mapa astral por encomenda
e vez por outra vou ao Paraguai: vendo muamba!
E eu sempre que posso me pergunto:
Existe outra saída neste mundo contemporâneo?
Cândida Ortiz
Do livro: "18 atores 18 poetas", Grupo Muito Prazer, 1995, RJ