Poeta,
não dates teus versos.
Eles não carecem de dia
de nascimento
–– pois que não têm hora
para morrer.
Ainda assim, o que pudesses datar
seria o gesto gráfico
literal
frásico
expressional.
Esquecerias por certo a gestação
incubação
hibernação.
Poeta,
teus versos não precisam
–– nem dependem ––
de cronografia;
também dispensam
genealogia:
o poema não tem pai,
e se tem mãe, é filho da puta,
filho de uma égua,
é santo do pé do pote,
nasceu no oco da palmeira,
pode ter vindo de carona
na bolsa marsupial
ou no bico da cegonha.
Poeta,
expele teu poema
antes que ele salte de ti
e sobreviva
à tua vida
(subvida,
sobrevida).
Entretanto, nada de dia
hora
mês
ano
local.
Os poemas estão por aí, soltos,
misturados à poesia.
Pegue-os.
Mas afasta deles
o gesto cartorário,
a mão tabeliã.
Edmilson Sanches