Moço, o senhor pode me ver um quilo de poesia,
Ou é um litro,
Dúzia e meia, será?
Desculpa, Moço, mas aos poucos,
Dentro de mim, sua lembrança se perde.
Como pedir sua presença,
Aonde encontrá-la,
Nem sei mais reconhecê-la se me vem ...
Ouvi por voz de sombras que sentir é monotonia,
Que a sensibilidade que flore em suas entranhas
Dificulta o entendimento.
Dizerem à bocas miúdas que metáfora
É coisa complexa, chata,
E que devemos, também, nos livrarmos dela.
Chegue seu ouvido bem perto, Moço, porque é segredo:
"Ouvi dizer que tem por aí uma nova poesia.
A poesia para quem não gosta de poesia."
Querer e saber da sua história é presunção.
Conhecer, louvar seus maiores amantes
E defendê-la é prepotência.
Estudar com afinco seus melhores contornos,
Burilar seus recônditos,
Fiar nas rocas da vida as mais belas
Palavras que melhor possam vesti-la ,
Fazê-la melhor hoje do que ontem,
Seduzi-la com prendas e mimos, pode não, Moço.
Não diminuí-la mas exaltá-la em toda a sua beleza
Para que olhos míopes, corações de pedra,
Mercantilistas oportunos e espíritos congelados
Possam enxergá-la , senti-la, não prostituí-la
E aquecer-se nos seus mantos de relva e ouro,
Não, Moço, isso não!
Desvesti-la por que?
E depois se a pobre, rica, morre de doença ruim ?
Chorarmos e exaltarmos a que se foi,
De que adianta ?
Que o Cão me tenha,
Que Ciço me recupere,
Se me perco, de mim.
Não seria de senso bom
Apresentar a melhor, a mais linda
Das expressões poética,
E deixar os que não a amam
Perderem-se em suas malhas,
Enredarem-se por seus fios,
Apaixonarem-se por suas teias
E olharem-na nos olhos
Sem medo,
Sabendo-a, convictos,
Que Aracne não é o que parece?
Se avexe não, Moço,
Nada contra sua pessoa,
Me vou ...
Bem sei que em estantes entre livros
Há muito que já não posso encontrar a dita
Talvez nas ruas reencontre a que perdi.
Quem sabe, aqui bem dentro,
No esquerdo do meu peito,
Ela ainda exista do jeitinho
Como a conheci ...