Se Deus fosse um pesadelo
a chance de acordar seria o tempo
e o gosto de dormir a nossa igreja
Ninguém poderia combatê-lo
a não ser o sonhador e sua teia
cercando a neve em incêndio
Abraçado ao luar, viria o peixe
nesse ataque feito de surpresa
e pássaros voando sobre o gelo
Mas despertar não seria Deus exposto
em carnes penduradas pelo susto
ou asas condenadas à frieza
O levante se faria em outro plano
com o avanço da manhã de seda
desabando os materiais do sonho
Deus assim mostraria um novo rosto
aberto como alguém que vem de longe
oculto para não perder o fôlego
Nei Duclós
Do livro: "No Mar, Veremos", Ed. Globo, 2001, SP