Sou feita de barro e sonhos.
Sinto em mim o turbilhonar
de todas as forças do universo.
Vim de um lugar obscuro: o útero.
Percorrerei longas veredas
até meu retorno ao barro.
Dessa lama humana
jorram canções, amores ávidos,
impulsos rútilos, insanos propósitos.
Escamo-me para extirpar o azinhavre.
Chego às vísceras, empalideço o todo
até surgir o branco da essência.
Acomodo medos e angústias
no rubi incrustado: cerne
do meu corpo que devora enigmas.
O silêncio se edifica em mim
exacerbando-se com o passar das horas:
igual ao dos pátios na madrugada.
Sussurros noturnos avolumam-se
sem peias no limbo da solidão:
suplicam clemência às potestades.
Pressinto a presença de Deus:
incitamento que faz irreversível
minha atitude diante da vida.
Frente a frente de mim
transcendência me arrebata:
jeito meu de romper o exílio.
Dúnia de Freitas