1
Sou um poeta só, sem geração,
que chegou tarde à gare modernista,
e entrou num trem qualquer, na contramão,
e vai seguindo sem sair da pista.
A de quarenta e cinco me tutela,
me trata como a um filho natural.
Eu chego às vezes tímido à janela
mas vou brincar no fundo do quintal.
Na poesia concreta, a retaguarda
é que me vê brincando de arlequim.
Às vezes fujo à rima e lavo um fardo
de roupas sujas, não tão sujo assim...
A de sessenta e um foi de proveta,
foi mágica de circo para um só.
Ninguém me viu caçando borboleta
ou pescando escondido o meu lobó.
Quem fez letra, cantou e usou bodoque
quem se fez marginal pela cidade,
será que fez poesia ou fez xerox
ou apenas tropicou na liberdade?
2
Eu sei, minha Maria, que o verão
já vai passando trêmulo nos dias.
E sei que é muito bom ter geração,
"que as glórias que vêm tarde já vêm frias".
Melhor, muito melhor, é ter sossego,
não saber nada sobre os bem-te-vis,
mas usar o radar (como um morcego)
e abrir as asas, pesquisar os xis,
ler os gênios antigos, ler os novos
(Bandeira e Cassiano, ler Cabral,
ler Mário, ler Drummond) e juntar ovos
de ouro para um estilo nacional.
O mais simples e sóbrio, o mais exato
no prazer de fazer como convém
na mistura que agrada e no formato
de meu próprio fermento e querer-bem.
E servir — prato-feito ou à la carte —,
servir por atacado e em comissão,
sete vezes servir, como quem parte
para tão grande amor... sem geração.