Enquanto escolho os feijões,
sem querer faço alusões:
um grão... dois...
e enfim,
não sobra tempo pra mim!
Corro pra lavar o arroz,
deixo a mágoa pra depois.
Enquanto lavo as verduras,
me frito em conjeturas...
Enquanto escorro os legumes
vou ruminando os queixumes.
Enquanto tempero a carne
sinto ligar meu alarme...
Enquanto destrincho o frango,
fervo a raiva em fogo brando.
Enquanto aqueço a gordura,
unto as minhas queimaduras.
Enquanto o fogo se mantém,
Santo Deus! Sou uma refém...
Enquanto misturo os molhos
cascas de sonhos, recolho.
Enquanto a salada esfria
asso a vida em banho-maria.
Na hora de pôr a mesa
é que refogo a tristeza.
Mas quando sirvo o cozido...
ah! nem tudo está perdido!...