O dia carpia cristais de aurora
e tangia sua harpa de prazer.
Tudo parecia vivo e nítido,
tudo cores fortes: o asfalto mais
negro, a folhagem mais verde,
o sorriso do jardim invernado
sobre a tela cinza e prata da chuva.
Nem sinal do seco e quente inferno
solar. Era vida que se derramava pelas
calhas, entrava em veias pelos nichos
das casas e dos postes velhos
e depois corria livre e densa pelas
sarjetas, para amar a lama e o lixo
das ruas. Percussão de turva música
na concha dos bueiros e sopro
de flauta em dó dos esgotos.
Sinfonia de água, terra e mato
para a fuga do vento-arco
arrancar notas das palmeiras
que regiam a orquestra natural.