Eu amo o homem de óculos.
Eu amei todos os homens de óculos.
Pra mim,
a parte essencial,
a parte inevitável do homem,
é plural:
são os óculos.
Porque os óculos sempra participam
do meu amor,
barroco amor em crise;
os óculos são um fetiche:
há sempre o momento
dos óculos fazerem strip-tease
e daí o homem fica dego de amor
e os olhos do homem
ficam trasprafrente,
transparentes.
Eu amo a mais
os homens vegos e estrábidos
e estigmáticos.
A tortura dos olhos do homem
me tortura,
me estigmatiza.
(Ah, toda a doçura,
toda a pieguice,
toda a gostosura
que há na vesguice...)
Porque é sério,
é muito sério mesmo, meu poeta,
o homem atrás dos óculos;
mas quando ele os retira,
se transforma, há um pretexto
pra ficar o outro homem
e a gente ama
como se cometesse um incesto.
Eu amo os homens de óculos
porque foram capazes de se cegarem
diante de mim e de me amar (amarem?)
de me amar sem nenhuma visão,
que a do seu próprio e mais cego
coração
(a grandiosa visão de um só momento).
Eu amo os homens
que foram capazes
de me enxergar
por dentro.
Yêda Schmaltz