Chuva de bençãos, água serena,
que sobre a lavoura, desce...
Venha, copiosa amiga,
corra, trazendo a pena da vida.
ao invés da pena de morte.
Boa companheira, seja bem vinda!
Minhas mãos estão calejadas,
nossa velha amiga, a enxada
trabalhou dura comigo.
Éramos uma, não mais duas
a fazer no sertão o serviço.
Esperando por ti, chuva amiga!
Caia, caia assim, bem mansamente,
se infiltre na terra o bastante,
para a boa semente molhar.
Talvez com sorte, ela cresça.
E assim que dinheiro apareça,
Vou arrumar a cerca e gado comprar.
Não, espera...não te vás ainda, chuva traiçoeira!
Não foi o suficiente que te deixaste aproveitar!
Eu aqui sonhando besteira, e você, que doideira!
Não é chuva verdadeira, só fez me enganar!
Veja, a semente está seca... assim não brotará,
e é a derradeira que tenho para plantar!
Ah! Trabalhei tanto para nada chuva ingrata,
a dura terra lavrei. Diga onde foi que errei?
Meus olhos lacrimosos vêem a paisagem,
Tudo verde, tudo cheirando a mato,
mato verde, mato de pastagem.
Nada brotando do que semeei.
Na estrada homens maltrapilhos,
mulheres semi-perdidas, vêm mais atrás,
seguidas de carcaças de cachorros e de filhos.
Vão enfileirados, sem coragem, pelos caminhos.
Fogem da vida de miséria, em no inverno
Da chuva que cai fora do tempo no solo duro.
Chuva que agora só irá renascer o pasto,
reviver o pobre e sofrido gado.
De que foge esta família? Por que partir?
A chuva não trás a vida?
Choveu, não choveu? Então por que sair?
Situação complicada, a chuva trás a vida.
Traz sim, mas não no tempo certo,
a tempo só vem só a lida, triste lida perdida.
A seca verde aí está, bem instalada.
Adeus chuva manhosa, aos céus retornarás.
Adeus fartura, nada de feijão, só pasto a renovar,
Sou pobre sertanejo, não aprendi a ruminar... Ainda.
Irei atrás, engrossar o número dos sem terras.
O número dos descamisados,
que bem era, quando estava a lavrar.
Também aumentarei o rol dos desempregados
Com meu estudo, com mãos calosas
Como sonhar com vida menos dolorosa?
Pobre de mim, ex-sertanejo, a falta de chuva
Transformou-me num quase mendigo
Estou sem rumo, mais que perdido.
Ajoelho peço a Deus misericórdia,
Está na hora da alma encomendar
Eis as portas da cidade, vou entrar?
Minha alma aflita diz: "Que pensas encontrar"?
Boa acolhida, capacho de boas vindas?
Nada, só terás maus olhares.
Ninguém parará quando mandares,
Não têm tempo, esta é a verdade,
E retirante não é mais novidade."
Minha alma continua: "Piedade não há na cidade,
onde estão os arranha céus!
Fuja de lá moço, vá sem demora.
Se refugie onde pobre mora, quase ao léu.
Olha o pobre é sofrido, ouve o coração
E sem poder lhe estende uma banda de pão."
Minha alma chora: " Bom não terdes filhos
O medo deles ficarem bandidos
Nunca te acompanhará!
Se os tivesse, a velha enxada
trocariam, veja só que sina,
Por a faca com que pudessem a assaltar."
E continua : "Ou morreriam de fome.
Pois idade demais teriam, para esmolar,
O povo mandaria que arranjassem trabalho.
Em que lugar da cidade,
Onde por caridade,
Haveria alguém que os quisesse empregar?"
Eu choro e digo: "Quem sabe poderiam vir a ser
Jardineiros, com terra saberiam lidar!"
A alma responde: "Qual, saberiam só de feijão e milho.
Nada disso a madame iria querer plantar.
É só uma tal de buganville, rosas, margaridas
Que só servem para adornar."
Digo: "Pobre de mim, não sei plantar flores
Mas não importa, as flores são mimosas,
Logo aprenderei a com elas lidar,
Exalam um aroma suave, são formosas.
pequenas, parecem falar de amizade.
Elas são o que de melhor haverá na cidade."
Minha alma desiste: "Vá, faça de sua vida um jardim,
Lute, e assim que puder, volte para seu mundo.
Vá meu amigo, aqui é outro Brasil, confie em mim!
Seu lugar é lá na sua terra, perto de seu pé de
serra.
Lá você é conhecido, sempre será bem vindo,
é sim!.
Aqui tem que viver provando que não é bandido e fim!"