Há uma cidade que preciso amar
até a domesticidade,
um livro de páginas submersas
que preciso ler de olhos fechados,
um céu amarelo de tristezas líquidas
que preciso apaziguar chovendo.
Uma rua lateral me espera numa reta.
Uma curva de sol, uma lasca de lua e madrugadas inteiras
que preciso remover com essas mãos.
Há relógios afundados nos assoalhos de repartições
públicas
e olhares de crianças famintas
que preciso esquecer para não chorar.
Um determinado 7 de Julho que preciso regar toda manhã.
Uns móveis velhos, numa casa apagada, onde me esperam
para o almoço de domingo:
uma garota de olhos verdes e seios mansos de bailarina
me espera numa curva deserta do caminho
para me assassinar a dentadas.
Há um vento quebrado, um oceano na janela,
um gato na varanda,
que me esperam com uma luz sem passado.
Há esse silêncio de fotografias em porta-retratos
onde preciso deixar um sorriso, um aceno,
um beijo azul e branco.
Há um quarteirão, uma ponte, uma porta,
uma avenida líquida
que preciso atravessar descalço
para chegar vivo.
Um homem velho me espera sentado na pedra.
Há rumor de pássaros e sinais de satélite a pouca
distância,
preciso ir.