AMOR
Ah! O amor sua mecânica voraz
que aciona asas de anjo e
combustões de satanás. Os seus
delírios de ser deus e nada
ser senão a chama, e a cera
de círios amalgamados ilusão
e luz — fugaz — de primavera;
mero sorver — ou só perder? — de
açúcares bordados em canção
a dois e em carnação efêmera
de
fêmea (ou macho): o fio gasto o
frio gesto — enquanto
o cio aos poucos se renova prova
os pastos do sono ou nos provoca
os cegos cogumelos do abandono.
Ah! O amor sua mecânica falaz
que recomeça e traz os sais
de oclusos mares insetos obtusos
atavares cativos — em explosão:
a compulsiva arte da avidez das
mãos e esse mútuo mergulho de
côncavos e convexos brusca busca
de nexos e nichos; ou os caprichos
a graxa o resvalar das graças
os toques túmidos de espada
em concha de úmido veludo. E
a rouquidão do suor — ou a
perdição do fervor —
no desabar do abismo onde se
abrem e fanam a um tempo só
todas as flores e se desata a
bem-amada
síntese dos sumos do prazer de
tudo — e se refrata em obscura
cor de conhecer a dor do nada.
MAURO GAMA
Do livro: "Expresso da Noite", Nova Fronteira,
RJ, 1982
Enviado por: Maju Costa
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