Eu não fiz uma revolução.
Mas me fiz irmão de todas as revoluções.
Eu fiquei irmão de muitas coisas no mundo.
Irmão de uma certa camisa.
Uma certa camisa que era de um gesto de céu
e com certo carinho me vestia, como se me
vestisse de árvore e de nuvens.
Eu fiquei irmão de uma vaca, como se ela
também sonhasse. Fiquei irmão de um vira-lata
com o brio com que ele também me abraçava.
Fiquei irmão de um riacho, que é nome
de rio pequeno, um pequeno que cabe
todo dentro de mim, me falando,
me beijando, me lambendo, me lembrando.
Brincava e me envolvia, certos dias eu
girava em torno do redemoinho do cachorro
e do riacho e da vaca, sem às vezes saber
se estava beijando o riacho, o cachorro
ou a vaca, com um grande céu
me entornando, com um grande céu
com a vaca no lombo e com o cão,
com o riacho rindo de nós todos.
Eu fiquei irmão de livros, de gentes.
Eu fiquei irmão de uma certa montanha.
Irmão de muitos rios.
E fiquei irmão de uma certa idéia,
e tive sorte, não me assassinaram
como a milhares de meus irmãos,
e provei a mim mesmo
a minha fidelidade.
Fiquei irmão de muito cidadão de nome certo.
Fiquei irmão de uma certa bebida,
uma certa bebida que se chama ceva orvalhada.
Um ritual de estima: amigos, futebol, poesia,
minha doce donzela de vestido amarelo
e mais as outras tantas donzelas
de vermelho, grená, cinza, branquelo,
os vestidos mais belos e os mais singelos!
Eu gosto de mim, de meu porte nem sei,
de minha doce e embalante imaginação,
de minha frágil e destemida poesia.