PALAVRA & CANTO

Todas canções têm algo de sonho,
revivem o mistério do canto. Tudo o que conta não tem sentido
quando falecem os signos.

Palavra é mais que mistério:
som dos neurônios batucando na mesa.
O imprevisto e o impossível
desenham a clave de sol.

Tudo o que me consome
é esse mistério intraduzível de ser,
a duras penas, a voz do espontâneo,
o despido improviso.

Todo cantor que se preza
traz nos lábios um pentagrama.
Na sua garganta nasce o pentagrama,
o reino das claves, morada da palavra
em seu vestido de festa.

Nada me sabe a música,
sua harmonia, o tempo certo,
o ritmo na pauta.

Porque o desenho de meu rastro
– a garatuja da palavra –
é um cinzel roto de destinos.

Enfim, todo o cantor é mudo,
quando o intérprete é somente voz.

                                           Joaquim Moncks

Do livro Ovo de Colombo, Alcance, 2005, POA

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