AUTOBIOGRAFIA

Gastei a vida em vivê-la,
inutilmente.
o amor amei
pelo amor de amar
o amor somente.

Alguns dentes possuo
de plástico,
outros ainda tenho de meus
mais carentes do que eu.

Rios de rugas no rosto
e um sorriso maroto
apesar dos desgostos.
Mil viagens concebi
na inércia do corpo.
amor me cansava.
da solidão me fartei.

Se bebia, ficava lúcido
(jamais saí
dos limites de mim).
Os olhos brilhantes
doloridos e lúcidos
sabiam a vida
como a vida estava.

As mãos caídas
ao longo do corpo.
O jeito errante de ser
como um navio sem porto.
Algumas vezes um livro
fazia-me viajá-lo
e esquecia o vazio
que a solidão havitava.

Alguns versos houveram,
que os anos perderam
e o viver gastou.
Poucos porres homéricos.

Capotagem de carro
e poucas cicatrizes.

Bamhei-me, de corpo e alma
em rios de selvagem privação
e de lascivas volúpias.

Vida bem rara e feita
de parcos fatos
dignos de lembrança.

Vida rara e feita
de muitas horas de tédio
e de sonhos desmoronados.

                                           Brasigóis Felício

Do livro: No barco dos dias - Trinta anos de navegação poética, AGEPEL, 2004, GO

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