O BULE DE CHÁ E A VIDA POR EXISTIR

Ele é marron, como as velhas folhas de outono
caídas das árvores e pisadas pelas chuvas.
Não foi guardado num armário, mas ficou esquecido
sobre a mesa do centro da sala.
Sua presença em lugar que não era para ser seu,
era maior do que toda a sala vazia, sem o preenchimento
das pessoas que ali reuniam sua família.
O bule se transformou em monumento,
em símbolo  dos movimentos dos corpos, das mãos
que o amparavam para verter o chá:
ele acompanhou sorrisos, enquanto vertia a bebida
quente nas xícaras — os sons das conversas e a
delicadeza das mãos que o colocavam de volta sobre a mesa.
O bule de chá nunca compreendeu porque não o
retiraram de volta para lavá-lo e reenchê-lo outra
vez com chá.
O silêncio enquadrou a sala como um quadro "para sempre"
e só ele, que nem lembrança é,
guardou a vida que se fez em torno,
como palavra eterna de um futuro que se renova,
quando a solidão é morte e vida ao mesmo tempo

                                                          Clarisse de Oliveira

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