RELÓGIO DIGITAL
Agora nem todo relógio
possui pulsar habitual:
o rastro de cada segundo
ou feneceu ou se cansou.
Ou então não: preferiu ser
ritmo de soluço e silêncio,
como se o seu tempo medisse
as coisas que não acontecem.
Consultar, sem ponteiros claros,
o relógio digital, é
conhecer os números densos
de um tempo que não é mais tempo:
pois, se nada gira em seu corpo,
se nada martela seu metro,
como pode — com pouco esforço —
o tempo existir todo o tempo?
Felipe FortunaDo livro: Ou vice-versa, Achiamé, 1986, RJ