Divide o nosso frango, a frugal fruta, as sobras do almoço
e sai-nos portas dentro quando o pôr-do-sol, a solução
do sol, o sol
das terras de portugal e das noites de madrid
dialoga connosco, connosco estabelece a nítida fronteira
entre aeroportos, casas — oh as casas — e a mulher que,
podendo ser a de um estivador, do camisola amarela, desse
irreverente basquetebolista que por um grande azar
não é das nossas relações,
foi, é, será sempre a mulher
encontrada e perdida na poeira, nas arcas,
nas infâncias multicoloridas
que parcimoniosamente nos excedem.
Procura, sim, procura as cores do nosso entendimento;
bebe do nosso vinho; vai à missa connosco; veste-nos
a pele de lobos esfaimados nesta selva de ratos onde os ratos
se confundem com navalhas, intelectuais empalhados, inquiridores
por conta d'outrem ( e própria), só para que o amor
um pouco sobreviva, exíguo e tenso, ri
às bandeiras despregadas como só um menino, como só
alguém que sabe da poda pode rir
enquanto os táxis, o choro, as dores de consciência
— que afinal não há, embora os cais... — atravessam o
meio-dia,
desesperadamente.
Ah, este homem procura as cores mais secas
do nosso entendimento; limpa-se
às nossas toalhas; chega
ao extremo de utilizar a escova privada da nossa privadíssima
higiene; rompe
os nossos sapatos ( meias inclusive); joga
à pancada connosco, ao eixo; e rouba-nos a carteira
como só quem sabe sorrir pode roubar-nos, pode assinar
de cruz por nós, solucionar
o problema da nossa talvez habitação
sem prestígio nenhum, ao menos uma praia de consolação
em que morrer
com o mesmo à vontade, modéstia e alegria
deste homem que procura,
procura as cores mais secas do nosso entendimento.