É um frio tremendo.
A água gela nas torneiras, a solidão
cresce com uma unha, uma sombra
atrai todas as camisas de silêncio, arde, é uma noite
encerrando os perigos da perdição, os ferros agudíssimos
do silêncio.
É um frio tremendo.
Perde-se o caminho de casa, a luz extingue-se,
pergunta-se pelo sangue e o sangue não responde,
o sangue
perde-se aos borbotões na vida, não há caminho,
não há
regresso, a sereia canta
no denso nevoeiro, mas não há esperança, a tempestade
é o único lugar, o único lençol, a voz
velocíssima
entregando-nos sem rendição, entregando-nos.
Como uma agulha fecha-nos os lábios, ata-nos
as mãos, como uma agulha de silêncio,
feroz, terrível,
cose-nos
contra as paredes e os olhos saltam, saltam, é um frio tremendo
onde tudo arde,
arde antiquíssimo, flecha no coração, solidão
descendo o braço, descendo devagar, espraiando-se
na terrível superfície do silêncio.
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