As tuas janelas fechadas com a luz de Maio
insultantes de vida.
As paredes - páginas não escritas,
avalanches de neve nos teus ombros demasiado leves.
Apenas os teus óculos traem a ausência:
frágeis,
negros,
com as lentes embaciadas pelos murmúrios
de um amor imaginado.
Pobre poeta,
luz não encetada -
pão e lágrimas
verde eco. Manto posto directamente sobre o coração.
Vagabundo incurável sob as luzes dos candeeiros.
A tua casa é agora um museu.
Atrás da janela -
uma casa habitada por dois automóveis
que te fazem caretas através das suas janelas com preço
fixo
em direcção aos céus onde tu paraste
aborrecido com tanta vida,
aborrecido com tanta morte.
Um pouco abaixo está o Café de outrora
onde bebias a tua solidão
em doses homeopáticas
imitando uma conversa sobre o dia chuvoso.
Agora por cima da tua janela está escrito preto no branco:
"Saída de emergência" - o teu pequeno segredo
de todas aquelas noites sem dias
quando a única prova de que existias
era a escrita trémula do homem da tabacaria
que somava conscienciosamente as tuas dívidas.
Liliana Ursu
(Tradução Nuno Júdice)
De: "Tabacaria, Revista de Poesia e Artes Plásticas",
Editor Casa Fernando Pessoa, Nº 5, Inverno 1997, Lisboa/Portugal.
Enviado por: Leninha