A serpe, que adornando várias cores,
Com passos mais oblíquos, que serenos,
Entre belos jardins, prados amenos,
É maio errante de torcidas flores;
Se quer matar da sede os desfavores,
Os cristais bebe co'a peçonha menos,
Porque não morra cos mortais venenos,
Se acaso gosta dos vitais licores.
Assim também meu coração queixoso,
Na sede ardente do feliz cuidado
Bebe cos olhos teu cristal fermoso;
Pois para não morrer no gosto amado,
Depõe logo o tormento venenoso,
Se acaso gosta o cristalino agrado.
Manuel Botelho de Oliveira
Do livro: "Música do Parnasso", prefácio e organização do texto de Antenor Nascentes, vol. 1, Biblioteca popular brasileira, nº 2, INL, 1953, RJ