Se não sou claro
                                  A Waly Salomão

                                                         Na memória

se não sou claro
e algaravias me espreitam,
canto o seu canto à flor da pele
e não tenho vontade de morrer.

nesse canto pousam expressões
não sobre o infinito
mas do que me esconde
do que sinto e não sei.

se canto o seu canto
na esquina, escondido, nefando,
não sou eu,
é sua música-poema
que incensa a esquina.

nave viajando
sertões sírios lírios
é você que explode
em polifônica eloqüência
portadora de humanidade.

Luiz Gonzaga Neto
 

 
Não Existe Paraíso

                                    para Waly

Não acontecerá o milagre previsto (assim creio)
Nada vai mudar inesperadamente
Estou só na caverna: isto é uma aventura lírica.
Enquanto a memória contempla o trovador
que parte através de palavras
Vejo-o, invisível na luz,

Seria o caso de derramar lágrimas?
Por que razão olho assim o infinito enquanto
nada mais que uma dor atravessa a Bahia deserta?
Mas aqui estão os versos, a melodia,
o riso e o escracho.
Não devo render-me a melancolia,
a falta também há de passar:
a saudade é afeição povoada de sofrimento.

Ah, sacanagem, o poeta de boca de largos sorrisos
regressa ao murmúrio onde se abriga
o abstrato eletrizante,
rumo aos jardins que não se acabam.
Adeus, baby. “Não existe paraíso”, responde, perdido
nos jardins pop-eruditos
com flutuantes árvores-parangolés.
É o caminho que todos nós, poetas,
fartos de vidinhas literários, tomaremos um dia.
Não há outro.

                                        Antonio Júnior

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