MavutsinimEu, Mavutsinim, o primeiro homem
a pisar este chão abençoado,
fui só como o horizonte do infinito.Senhor do universo, criei de uma concha
a mulher que o meu corpo reclamava.A beleza tem forma, na verde luxúria
das ervas resinosas que nos acolheram.O espírito do sol e o espírito da lua
pousaram sobre nós a sua luz.O ventre da mulher cresceu como o húmus
fertilizado pelas águas vermelhas.Ergui nos braços o meu filho varão
em oferenda à estrela da montanha.E seguimos as sendas, que eram nossas.
A mãe voltou à sua aldeia,a lagoa,e encantou-se, na concha de que viera.
Os índios são os filhos do meu filho.Eu, Mavutsinim, cumpri o meu destino.
Ode à índia VanuíreEsta casa onde moro
exatamente este lugar
onde estou
esta sala
foi uma oca caingangue.Estas ruas por onde ando
foram trilhas caingangues.Por onde quer que eu passe
sinto a sombra da índia Vanuíre.Sinto uma flecha me atravessando
a garganta.Sinto uma flecha me atravessando
a língua.Morro e renasço ontem
hoje
no inferno.Vejo o rekakê Vahuin
me chamando para a luta.Tenho vergonha
da minha covardia.Onde estou sentado
era uma pedra
junto ao fogoé uma perda
a alma da cinza.Onde me deito
reinam
os ossos dos ancestrais.A velha Vanuíre
trouxe a paz?O esquecimento
apatia
morte lenta de quem fôramos.Éramos índios guerreiros
condenados à morte
encolhidos como uma criança
no útero.Iríamos para a terra fria
os guerreiros chorariam
por nós.Os anciãos chorariam
por nós.Hoje ninguém chora
por nós
sobreviventes
como um tição apagado
na fogueira.Ah Vanuíre
para que existimos?Estou ouvindo a terra do homem
a terra do homem
a terra do homem.Estou ouvindo
vozes do outro mundo
Vanuíre e Vahuinoutros rekakês
Congue Huí
Charin
Cangruí Rugrê.Se lamentam
morrem mais uma vez.José Carlos Mendes Brandão