POBREZA II
    (DECLARAÇÃO DE BENS)

                                  Aos meus colegas

     Escolhi para mim
     — cabeça de poeta,
     adolescência pura —
     o que não deveria escolher
     vivendo no Terceiro Mundo:
     dediquei minha vida
     à Educação e à Cultura.
     Professora da Universidade Brasileira,
     não pude comprar fazenda,
     chácara, terreno ou boi,
     ( essa goiana maneira de ser ).
     Eu só pude criar,
     no meu curral de sonho,
     o canto do cavalo,
     o canto da boiada
     em poesia aberta e hermética;
     essa boiada que tanto aflige,
     ruminando na janela
     da minha aula de Estética.

     Apenas com um salário de sucata,
     sustentei o filho e as filhas
     que partilhei ao gerar,
     mas que não dividi na hora
     dos divórcios, das partilhas.
     (Apenas com o salário,
     pois dispensei o tal “alimento”
     da descasada profissional.)

     Fiquei com a Poesia,
     esse bagulho
     terceiromundista,
     este meu Bem;
     fiquei com a Pobreza,
     o meu orgulho:
     nunca roubei ninguém.
     Não fui grileira e nem
     posseira de nada
     e, se invadida,
     como fui, certa vez,
     por astutas fazendeiras,
     ora, que bobagem!
     A minha obra está datada.
     A Poesia
     é o meu Patrimônio:
     a palavra certa,
     a palavra dura.
     A poesia canta
     e eu fico muda,
     de espanto.

     Meu Patrimônio maior
     é a Literatura.

                                                      Yêda Schmaltz

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