De Saudades
Os olhares deixam-se tecer pelos fios da espera.
Em tuas ausências, descubro-me em ansiedades
Rendida à ternura do lembrar, ao afago do recordar
É como se entregasse o peito ao desatar do sentir
E num soprar de silêncios incontidos, confessasse-me
Renegando o claustro, a tortura do emudecer-me
É que os versos aliciam minha pretensa quietude
Derramam-me de quaisquer supostas medidas
Transbordam insones nas águas despertas
Do coração que só se sabe a viver em ti
É que deste às minhas letras tuas senhas
As entrelinhas dos teus desejos e expressões
Assim conjugo-te em meus assombros
Como se o “eu” e o “tu”, a qualquer tempo
Fossem sempre feitos do inequívoco nós
Ardem em minhas mãos os teus gestos
E tudo parece combinar com o tudo de mim
Entrelaçam-se meus dedos quase sem ar
Como a buscar vestígios do que não foi dito
Vezes, dispensas a palavra, o passo seguinte
Asfixiando o que tanto sei e que não revelas
Mais ainda ficas em mim nesses momentos
Quando te pensas à salvo em tuas fugas
Nesses dias, em que tudo me falta
E um fino fio me sustenta a alma
Alterno-me entre luas prateadas de saudades
E dias que me escrevem sobre teus cheiros
Como se a visão fosse também olfato e paladar.
Minhas mãos sempre acham que virás
E compõem e me delatam sem pudores
Dizem dos meus encantamentos e delírios
Desse estremecer permanente que me rodeia
Quando te vejo em meus olhares...
Sabem-me as mãos
Sabem-me as mãos
Quando, amiúde
Ensaiam vôos de letras
Suspensas em suspiros
Entrecortados versos
De segredos e precipícios
Mãos que transbordam
Rasuras, oceanos e desertos
Sabem-me as mãos
Quando anoitecidas
Bocejam a angústia
Do olhar insone
Que não se reconhece
No espelho que o espreita
Pará cá do que se permite ver
Apenas a vida branda
Em enganadora sensatez
Sabem-me as mãos
Quando se deixam pendidas
Estendidas em nuvens
Parindo-me novos horizonte
Ou a navegar nas águas turvas
Onde os olhares mergulham
Em cicios, dissonâncias e sussurros
Confrontando a solidão da alma
Atravessada em indagações
Sobre o respirar da vida
Sabem-me as mãos
Quando vem do gris a palavra
Que se dissimula em quietudes
E o eco é a dor que cala
O frio corte da solitude
Em que se rasga o sentir exangue
Sabem-me as mãos
Que me alforriam algumas palavras
E me amordaçam outras tantas
Estancando a chaga dos lábios
Com torniquetes de silêncios
Contendo a caligrafia
Que sangra o teu nome, a saudade
Fernanda Guimarães