NO CÁRCERE

Por que hei de, em tudo quanto vejo, vê-la?
Por que hei de eterna assim reproduzida
Vê-la na água do mar, na luz da estrela?
Na nuvem de ouro e na palmeira erguida?

Fosse possível ser a imagem dela
Depois de tantas mágoas esquecida!...
Pois acaso será, para esquecê-la,
Mister e força que me deixe a vida?

Negra lembrança do passado! lento
Martírio, lento e atroz! Por que não há de
Ser dado a toda mágoa o esquecimento?

Por que ? Quem me encadeia sem piedade
No cárcere sem luz deste tormento,
Com os pesados grilhões dessa saudade?

Do livro "Sarças de Fogo", in Poesias, Livraria Francisco Alves, 1961, RJ

                              


MILAGRE

Depois de tantos anos, frente a frente,
um encontro... O fantasma do meu sonho!
E, de cabelos brancos, mudamente,
quedamos frios, num olhar tristonho.

Velhos! ...Mas, quando, ansioso, de repente,
nas suas m?os as minhas palmas ponho,
ressurge a nossa primavera ardente,
na terra em bênçãs, sob um sol risonho.

Felizes, num prestígio, estremecemos;
deliramos, na luz que nos invade
nos redivivos êxtases supremos;

e fugimos, volvendo à mocidade,
aureolados dos beijos que tivemos
no milagre divino da saudade.

                                              Olavo Bilac

Do livro: "A Tarde", in Poesias, Livraria Francisco Alves, 1961, RJ

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