Saudade
És a filha dileta da noss'alma
Da noss'alma de sonho e de tristeza
Andas de roxo sempre, sempre calma
Doce filha da gente portuguesa!Em toda a terra do meu Portugal
Te sinto e vejo, toda suavidade
Como nas folhas tristes dum missal
Se sente Deus! E tu és Deus, saudade!…Andas nos olhos negros, magoados
Das frescas raparigas, namorados
Conhecem-te também, meu doce ralo!Também te trago n'alma dentro em mim,
E trazendo-te sempre, sempre assim,
É bem a pátria qu'rida que eu embalo!
Anoitecer
A luz desmaia num fulgor d'aurora,
Diz-nos adeus religiosamente…
E eu que não creio em nada, sou mais crente
Do que em menina, um dia, o fui… outrora…Não sei o que em mim ri, o que em mim chora,
Tenho bênçãos de amor pra toda a gente!
E a minha alma, sombria e penitente
Soluça no infinito desta hora!Horas tristes que vão ao meu rosário…
Ó minha cruz de tão pesado lenho!
Ó meu áspero e intérmino Calvário!E a esta hora tudo em mim revive:
Saudades de saudades que não tenho…
Sonhos que são os sonhos dos que eu tive
Florbela Espanca