Alonso

Alonso não volta.
Sentenciou Padre Olavo, previu a cigana Yolanda
cujo ortônimo era Maria da Conceição;
garantiu o carteiro Hermógenes da Silva de Alcântara Machado
com aquele nome rebuscado
de chefe de repartição.
Olha, seu poeta, Alonso não volta mais.
Pro seu CEP só tem a fatura da Light, do Banco, da Renner e do Gás.
Alonso não volta. Garantiu Edilamar, minha analista. Poeta, sofrer de amor só é bonito na revista .
Arranja uma moça, vai lavar louça, deixa de desperdício, encontra outro vício, outro ofício, outro hobby, outro norte, outro rapaz!
Arranja outro bofe!
Sugeriu Divandir, o cabeleireiro,
que Alonso, esse truqueiro,
não volta mais.
Alonso não volta.
Disse com uma voz robótica a locutora do metrô.
Desça na próxima estação,
que nesse vagão é proibido sofrer de amor.
Meu filho, escuta sua mãe: com tanta gente no mundo,
vai se coadunar justo a quem não te quer?
Dona Lourdes, Dona Lourdes!
Em assunto do coração, ninguém mete a colher.
Extra! Extra! Alonso não volta! Disparou Josimar, o jornaleiro.
Não é boato ou fofoca, mas não se fala noutra coisa no Rio de Janeiro.
E disse Dalila, a atendente da sorveteria desaforada e sem compaixão:
“Alonso não volta, meu camarada. Só tem sorvete de limão”.
Marco Aurélio da Cunha Siqueira, gerente do Bamerindus,
também não disse nada diferente.
Alonso não volta. Se contenha. Digite sua senha, mas antes me informe o número da sua conta corrente.
E sem fazer rodeios, me deu o troco, Soraia Ribeiro,
a caixa pessimista do supermercado Mundial.
Alonso não volta. E não: outro piço você não encontra igual.
Reginaldo, o técnico de informática,
concluiu depois de formatar o meu computador : não tem conserto. Alonso não volta não, senhor.
Karen Botelho, a oftalmologista zarolha,
disparou só pra me contrariar: se me permite um conselho,
sai dessa bolha e se enxerga, querido. Alonso não vai voltar.
Alessandra Trindade , a âncora sensacionalista do jornal do meio-dia,
informou que Alonso não volta, e que já passou da hora de eu fazer terapia.
Já faço, ô vadia!
Josias, o vendedor seboso de cachorro quente,
Adelaide, a manicure mão de vaca,
Gomides, o guarda municipal, e o resto do mundo,
incluindo Edmundo, o esquisito professor de canto,
disseram em coro: Alonso não volta. Enxugue esse pranto.
E só de pirraça não parei de chorar.
Embora eu saiba que, mais dia, menos dia,
só pra calar a boca dessa gente atrevida, invejosa e vazia,
Alonso há de voltar.

                                                            Herton Gomes

1º lugar no "III Concurso de Poesias Autores S/A", 2014, RJ

 

« Voltar