VIVER
Que tortura saudável
Que dor agradável
Viva ! eu vivo
A doida passeia com calma pelo jardim dos mortos
Lavem as víceras
Morcegos amáveis chupam meu sangue
Frio e tépido á jorrar
Eu sou um abismo repleto de espelhos
Que enganam a queda
Eu quero gritar meu ódio em silêncio
Morrendo, moerrendo
Meus ombros cansados arrastam um peso
Pesadas torturas
Eu amo a solidão
Nem ao menos existir
Persistir em ser Mongo
Versos livres do terror do veneno, açúcar
Cutucar tubarões
Minhas assas são falsas, nem pernas eu tenho
Quebraram meu braço, mentira sôfrega
Minh'alma sôfrega pediu-lhe arrego
A arte despontou-se com ares de arcada
Abandonou-se a certeza
Abotoaram meu vestido preto estirado num caixão bem moldado
No formato da esfera quero ser alimento
De algum animal selvagem
Meu sangue é nutritivo, ma´s os ossos são fracos
Queimem meus restos e joguem no ar na boca de urubus
Bocejam a ausência perto de mim
Não respire veja a tua morte
A minha vem em sonhos
Sonhei entre outros morrer escalpelada
Sarcófagos de esperança eu deposito na alma
Que sangrando espera
Espere um pouco que vou lhe mostrar
O gosto da morte não fale comigo
Não ouça... não compreenda
Quero silêncio
A solidão é amante de um mundo escrito
Vingaram minha morte
Me trazendo a vida
Me fazendo viver.
O quadro
A vida acanhada recorda o peso da velha palavra
Livre de sonhos completos de encontro a reflexos de lua
Violino pequeno se perde na falta do pobre sorriso
Que o menino assanhado disperta na presença da falsa distância
O riacho dotado resalta o gosto de belas lembranças
Na ópera de falhas humanas
O encontro presencia o humano
A distância é o livre reflexo de feios detalhes expostos.
Carla Carvalho