LIBAÇÃO

É do nascedouro da vida a grandeza.
 É da sua natureza a fartura 
a proliferação
os cromossomiais encontros,
 os brotos,
os processos caules,
 os processos sementes
os processos troncos,
 os processos flores,
 são suas mais finas dores

As conseqüências cachos, 
as conseqüências leite, 
as conseqüências folhas
as conseqüências frutos, 
são suas cores mais belas 

É da substância do átomo
ser partível produtivo ativo e gerador 
Tudo é no seu âmago e início,
patrício da riqueza, solstício da realeza 

É da vocação da vida a beleza
e a nós cabe não diminuí-la, não roê-la
com nossos minúsculos gestos ratos
nossos fatos apinhados de pequenezas,
cabe a nós enchê-la,
 cheio que é o seu princípio

Todo vazio é grávido desse benevolente risco 
todo presente é guarnecido 
do estado potencial de futuro 

Peço ao ano- novo 
aos deuses do calendário 
aos orixás das transformações: 
nos livrem do infértil da ninharia 
nos protejam da vaidade burra
 da vaidade “minha” desumana sozinha
Nos livrem da ânsia voraz
daquilo que ao nos aumentar 
nos amesquinha 

A vida não tem ensaio
mas tem novas chances 

Viva a burilação eterna, a possibilidade:
o esmeril dos dissabores! 
Abaixo o estéril arrependimento
a duração inútil dos rancores

Um brinde ao que está sempre nas nossas mãos: 
a vida inédita pela frente
e a virgindade dos dias que virão!

Elisa Lucinda

Do livro: Euteamo e suas Estréias, Record, 1999, RJ

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