Estátua de Carlos Drummond em Copacabana (Rio), de Leo Santana, com um verso do poema "Mas viveremos"

SYNTHETICO [SONETO 340]

De como a poesia é definida
depende a trajectoria do poeta.
Qual é, pergunto, a formula secreta
que traça em poucas linhas uma vida?

Segundo Rilke, a lyra não duvida,
mas Eliot é turrão, e tudo objecta.
Bashô quanto mais crê menos se aquieta.
Pessoa diz que é fé na dor fingida.

Divergem tantos mestres só no tom.
Não ha por que dar tractos ao bestunto:
ha chimica no verso, não um dom.

Qualquer opinião, qualquer assumpto
será, verdade ou não, poema bom
si for densa a fracção, breve o conjuncto.

          
Estátua de Florbela Espanca no Parque dos Poetas,
                          em Oeiras, Portugal

FORMAL [SONETO 955]

Discute-se qual genero é mais puro
– haikai, soneto, glosa, oitava ou trova –
e cada defensor mostra uma prova
que, num, o verso é solto e, noutro, duro.

Uns acham que este aqui tem mais apuro,
emquanto aquelle traz algo que innova;
alguns mais radicaes chamam de "cova",
"prisão", "tunnel do tempo" e "quarto escuro".

Nem oito, nem oitenta: a poesia
é boa ou má conforme o testemunho
que dá de seu auctor emquanto a cria.

Si a faço redondinha, é que meu punho
encaixa em cada syllaba outro dia
vivido, sem minuta nem rascunho.

                                                                          Glauco Mattoso

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