O DESCALABRO ECONÔMICO DESTE FINAL DE SÉCULO
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Roberto C. P. Júnior
"O desconhecimento de uma lei não é uma justificativa
válida para se descumpri-la."
Este é um princípio básico da ciência do
direito, porém impossível de ser observado para as leis existentes,
tal o seu número e complexidade. Uma pessoa que quisesse, realmente,
conhecer toda a gama de leis a que está sujeita no decurso de sua
vida, teria de gastá-la inteiramente no estudo aprofundado das inúmeras
legislações em vigor. E é bastante provável
que não atingisse o seu objetivo. Mas o princípio permanece
válido para certas leis da natureza, a que o ser humano igualmente
está sujeito durante a sua passagem pela Terra, já que ele
é também uma espécie dentro dela, como tantas outras.
O princípio é válido porque contrariamente às
dos homens, essas leis naturais são muito simples e claras. Ninguém
pode desobedecê-las sob a alegação de ignorância,
pois basta um mínimo esforço de observação
para se reconhecê-las. Uma dessas leis básicas é a
que dispõe sobre o equilíbrio. Observamos nitidamente seus
efeitos nos locais onde a influência humana ainda não chegou.
Um ecossistema ainda não corrompido pela ação
humana desagregadora sempre estará em equilíbrio. Jamais
apresentará, por exemplo, uma disparidade acentuada entre o número
de espécies que o compõem. Nunca se observará um dos
integrantes tentar destruir o ecossistema, visando angariar vantagens imediatas
para si. Não haverá lá, tampouco, alguma espécie
desprovida do necessário para sua sobrevivência, tendo de
experimentar "penúrias materiais". Os seres que pertencem ao ecossistema
dão de alguma forma algo para o todo, recebendo em contrapartida
o necessário para sua subsistência. Equilíbrio contínuo
entre o dar e o receber.
Mesmo as espécies do reino vegetal obedecem automaticamente
essa lei do equilíbrio. Plantas e árvores recebem da natureza
os nutrientes do solo e dão à ela flores e frutos. Utilizam
o gás carbônico da atmosfera e devolvem oxigênio.
Já a espécie humana se comporta de maneira diferente.
Justamente ela, que com sua organização social deveria constituir
um exemplo vivo de obediência incondicional à lei do equilíbrio,
desprezou-a acintosamente, na mais leviana autopresunção.
Devido à sua constituição espiritual, essa espécie
ocupa uma função especial dentro da natureza. Sua missão
consiste em elevá-la e enobrecê-la, aperfeiçoando na
matéria o modo de cumprimento das leis vigentes. Assim estava previsto.
No entanto, essa expectativa não se confirmou. Todas as outras
espécies continuaram obedecendo a seu modo, instintivamente, as
leis naturais. Mas o ser humano, o elevado ente espiritual que deveria
zelar pela natureza, não deu nenhuma importância a essas leis
básicas. Leis que vigoravam antes do seu aparecimento na Terra.
Colocou-se presunçosamente acima delas, como se não lhe dissessem
respeito. Em sua inconcebível arrogância arvorou-se senhor
da criação, enquanto nem cumpria seus deveres de simples
integrante dentro dela.
Por isso agora ele assiste, entre incrédulo e perplexo, o desmoronar
inevitável de toda a sua obra falsa, erigida descuidadamente sobre
um solo pouco firme. Toda a obra humana foi erguida, por ignorância
e teimosia, sobre um solo arenoso, impróprio para se edificar qualquer
empreendimento. O ser humano não observou, principalmente, a fundamental
lei do equilíbrio, que se constitui a base, o solo firme que suporta
toda a edificação. De nada adianta se uma construção
é muito bem planejada, se são utilizados os materiais mais
resistentes, se para tanto empregam-se os melhores engenheiros e arquitetos.
Erigida sobre a areia, ela terá de ruir cedo ou tarde.
E a ciência econômica é uma das muitas obras engendradas
pelo intelecto humano completamente dissociadas desse princípio
básico do equilíbrio. Assistimos hoje na maioria dos países
a um esforço frenético, quase desesperado, dos mais conceituados
especialistas procurando controlar os múltiplos indicadores econômicos.
Com admirável empenho (reconheçamos) eles tentam fazer funcionar
mais ou menos bem a absurdamente complexa e instável máquina
econômica que inventaram, efetuando ajustes freqüentes nos vários
instrumentos de controle à disposição. Com precários
resultados porém. Os números que traduzem o imenso descalabro
em que está mergulhada a economia mundial neste fim de século
parecem irreais de tão gigantescos, e mesmo assim continuam a crescer,
como se tivessem vida própria. Por toda a parte aumenta a disparidade
entre produção e consumo, entre trabalho e remuneração,
entre dívidas contraídas e benefícios gerados. Macro
e microeconomia se fundem num megacaos assustador, onde o desequilíbrio
dá a tônica em todos os setores. (*)
E em meio a toda essa balbúrdia sobressaem os ilustres economistas,
que digladiando não muito cavalheirescamente entre si, procuram
cada qual impor sua revolucionária e exclusiva solução
salvadora.
Diariamente vemos desfilar na imprensa os mais contraditórios
e contundentes esclarecimentos sobre as causas e efeitos de desvalorização
cambial, controle inflacionário, déficit público,
crise bancária, inadimplência, capital especulativo, flutuação
de juros, ações sobrevalorizadas, desemprego crescente, concentração
de renda, etc, etc.
Toda essa confusão poderia ser evitada se, desde a base, fosse
observado simplesmente o necessário equilíbrio entre o dar
e o receber.
Na verdade, as pessoas já vivem numa permuta contínua
de valores, sem contudo dar a devida importância a isso. O seu maior
erro aí - imperdoável - , foi justamente negligenciar o indispensável
equilíbrio neste processo natural de troca.
Com o seu trabalho elas dão algo ao mundo em que vivem, à
Terra, e por isso recebem dela o necessário para a sua vida terrena.
Em primeira linha alimento,vestuário e moradia. Em seqüência
natural outros bens complementares, sempre segundo sua própria contribuição.
O dinheiro nada mais é do que um instrumento, um meio para facilitar
o fluxo entre o dar e o receber no nosso mundo civilizado. Fluxo este que
todos os implicados têm o dever de manter
em absoluta eqüidade, cuidando para que os pratos da balança
permaneçam rigorosamente nivelados.
Assim o quadro geral de uma atuação coletiva harmônica.
Simples demais? Sim, como tudo aliás que possui real valor, que,
portanto, ainda não foi infectado pelas diretrizes intrincadas do
limitado intelecto humano. Sucede porém que como em muitas outras
coisas o ser humano resolveu "aperfeiçoar" também a lei natural
do equilíbrio. Na sua estreiteza de compreensão, fruto de
sua irrefreável e também já indisfarçável
decadência espiritual, ele imaginou poder levar uma vida mais bela
e feliz se abaixasse um dos pratos da balança em seu favor. Ele
quis receber cada vez mais, dando cada vez menos. E com o passar dos séculos
esse desequilíbrio cresceu e cresceu, até chegar ao ponto
em que nos encontramos hoje, onde o dinheiro passou a ser um fim em si
mesmo, ao invés de um mero instrumento terrenal para efetivação
do dar e receber.
A partir daí, o que restava de dignidade e respeito ao próximo
dessa criatura cega de cobiça extinguiu-se de vez. Passou a querer
levar vantagem em tudo para angariar mais dinheiro, pouco importando se
para tanto tivesse de infligir danos ao seu semelhante.
Para obter mais dinheiro empregados enganam seus patrões, patrões
exploram seus empregados, estelionatários estudam novos golpes,
especuladores lançam boatos nas bolsas, fábricas se juntam
em cartéis, bancos se transformam em casas de agiotagem, políticos
vendem seus votos, madeireiras arrasam florestas, nações
brigam entre si por interesses comerciais. E todos contraem dívidas
que não podem saldar. Engana-se, rouba-se, mata-se, destrói-se
e guerreia-se por dinheiro.
A gananciosa humanidade torceu o mais que pôde o preceito dado
a ela de conservar o equilíbrio em tudo, abaixou ao máximo
o prato da balança a seu favor, na ilusão de conquistar com
isso a felicidade terrena. O que ela não imaginava, porém,
é que ao contrário das leis humanas, as da natureza não
podem ser desobedecidas impunemente. A humanidade conseguiu, sim, fazer
descer o prato da balança durante um certo tempo, mas agora ele
retorna violentamente à sua posição original, atirando
para longe tudo o que estava acumulado em seu interior.
No que tange à economia, isso se evidencia como uma tragédia
de proporções apocalípticas, sem paralelo na história
humana.
Centenas de milhões de pessoas vivem hoje na mais absoluta miséria,
sem qualquer perspectiva de melhoria de suas condições materiais.
Os que têm um emprego e ainda ganham o suficiente para viver condignamente
formam uma
única e extensa legião de descontentes, firmemente convencidos
de que a vida lhes foi injusta ao denegar-lhes a riqueza material. Ao invés
de enobrecer o mundo com valores espirituais e terrenos, eles só
fazem crescer a má vontade, a inveja e a desconfiança. Já
os que possuem muitos recursos, em sua maior parte os direcionam quase
que exclusivamente para deleite próprio, sem a menor preocupação
de soerguer e conservar o bem comum.
A cada ano, a cada mês, a cada dia vemos avolumar-se o descalabro
econômico mundial, gerando angústia, desesperança e
insegurança. O pedestal do ídolo dinheiro, erguido por tantas
mãos prestimosas até uma altura
que obscurece totalmente qualquer vislumbre de vida espiritual, está
se desfazendo aos pedaços sobre uma humanidade amedrontada e estarrecida.
A instabilidade econômica mundial traz convulsão social,
crise de governabilidade, medo e, sobretudo, insegurança generalizada.
Esses os frutos que temos de colher agora, pela não observância
de uma lei simples e todavia tão essencial, que sozinha poderia
garantir total harmonia de vida neste nosso conturbado planeta.
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(*) Alguns poucos exemplos isolados:
Cerca de 60% da população mundial vive com uma renda
de até dois dólares por dia; 1,3 bilhão de pessoas
sobrevivem com até um dólar por dia.
A dívida pública americana cresceu 4.145 vezes do início
do século até 1995. No final daquele ano cada bebê
americano veio ao mundo devendo 18.930 dólares (dívida pública
per capita).
Em fins de 1996 a Organização Internacional do Trabalho
estimava haver um bilhão de pessoas desempregadas ou subempregadas
em todo o mundo.
O volume de recursos disponíveis na ciranda financeira mundial
é várias vezes superior ao que se poderia adquirir com eles.
Giram hoje no mercado de ações e de derivativos cerca de
67 trilhões de dólares. Todo o ouro existente no mundo não
soma 6 trilhões de dólares.
A renda conjunta de 358 multimilionários é superior
aos rendimentos somados de 2,3 bilhões de pessoas (45% da população
mundial).
Nos últimos quinze anos 1,6 bilhão de pessoas viram
sua renda diminuir.
Desde 1980 noventa países sofreram declínio econômico.
Há atualmente 131 países às voltas com crises
profundas em seus sistemas bancários.
Categorias profissionais que são verdadeiros sustentáculos
à integridade de uma nação, como as dos professores,
médicos e pesquisadores são parcamente remuneradas e mal
reconhecidas, enquanto que boxeadores, pilotos de corrida, jogadores de
basquete ganham milhões de dólares para contribuir com nada
para coisa alguma e são elevados à categoria de heróis.
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Mestre em Engenharia e autor do livro on-line "Vivemos os Últimos Anos
do Juízo Final".
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