Serpentinas e carolinas cheirando a canela invadem com tesão o salão
 
José Luiz Dutra de Toledo
 

É Estou com dor de cabeça. O estado de saúde do meu ancião cachorro Aragão é delicado. Mas me dirão que os problemas do mundo nos são muito mais graves. Mas eu sei que ambos são graves e delicados e igualmente me abalam. Refugio-me em Chopin ou em Prokofief ou em Beethoven... O calor e as chuvas estão concomitantes e me exasperam... e como não sou o centro do mundo e nada no mundo funciona só para mim, tenho que padecer passivamente neste paraíso. Minha irmã Margarete está numa competição doentia comigo. Apesar dos meus problemas de saúde, percebo que tenho uma qualidade de vida melhor do que os outros membros da minha esfacelada família. Concerto de Fréderic Chopin para piano e orquestra  número um em Ré menor Opus 11. Minha amiga Esmeralda reclama que em minhas viagens dos últimos 5 anos não lhe tenho mandado postais. Mas como iria lhe mandar postais de Tabuleiro ou de Piumhi se tais cidades não têm porte para produzirem postais e só a estas cidades viajei mais recentemente? Pense um pouco, amiga de Belém, desde que voltei daí em 1989 eu circulei entre Rio, Minas e São Paulo, por lugares que já lhe são bem conhecidos e que não chamariam mais a sua atenção além do simples registro da minha repassagem pelos mesmos. Lamentarei enormemente se o cartão que lhe enviei de Montevideo não chegar às suas atenciosas e carinhosas mãos. O som do piano me harmoniza, me serena. A cachorrinha Saragoza ia se desacostumando de comer ração e só estava querendo leite com aveia, frutas e o arroz com legumes misturados com uma ração diet importada receitada ao ancião Aragão. Para forçá-la a comer a sua ração novamente deixei-a só a água e sua ração até que.. voltou a se alimentar como deve. É uma luta, senhor!.. ou senhora? A extensão para a internet não está funcionando . Isto me levou a adquirir mais um novo aparelho telefônico. Dívidas, dívidas e não sei se vou receber o meu salário em dia. Na semana que vem volto a trabalhar depois de um mês de férias. Coloquei o chá mate para ferver enquanto continuo ouvindo Chopin... Este é o meu primeiro texto não manuscrito. Muitos dos meus manuscritos eu mesmo os rasguei. Não sei se teriam algum valor além do que eu lhes atribuo. Minha biografia é minha obra ou vice-versa. A fragmentação da obra e da vida de Fernando Pessoa em dezenas de heterônimos nos mostra a labiríntica impossibilidade da unidade no decorrer da procura chamada vida. Temos muitos seres coabitando em cada um de nós. Quanto mais seres abrigamos dentro de nossa maternal e paternal persona mais ricamente existimos. Por tanto recorrer à palavra “labirinto” vocês podem pensar que estou com labirintite, mas não estou. Neste caso, mais uma vez, Fernando Pessoa tem razão, só quando estamos maus dos olhos é que pensamos. Jorge Luis Borges foi condecorado pelo ditador Augusto Pinochet. Borges se considerava culturalmente um inglês exilado em Buenos Aires?  Fernando Pessoa só rompeu com o fascismo salazarista quando o autoritarismo de Salazar proibiu a existência das sociedades secretas, entre estas a Franco-Maçonaria defendida contundentemente por este que está entre os dez maiores escritores europeus do século XX. Se o século XX começou só após o fim da primeira guerra mundial (1918) e acabou com o fim da guerra-fria e com a desestruturação da União Soviética (segundo o historiador marxista inglês Eric Hobsbawn) nós já estaríamos no fim da primeira década do século XXI? Então os séculos têm intensidades e durabilidades não cronológicas. “Estou murado em minha estravagância. Que voz divina ou que estranha voz consentira habitar o meu silêncio?” —  indaga Yves Bonnefoy em seu livro Do movimento e da imobilidade – 1953 – incluído em suas Obras Completas publicado no Brasil pela Editora Iluminuras. Sem internet fiquei reduzido a pó. Fiquei tão isolado sem a internet, meu Deus!.. Já sei: estou viciado em internet. Mais esta!..
Passou um avião por cima da minha casa e eu, já com 47 anos na cacunda, voltei a gritar: —"Ô avião!.. Traz um  neném prá mim!..” Minha cadelinha adora carregar as minhas sandálias domésticas!.. Ela não é vira-lata, é uma boxer pé de chinelo!.. A família estadunidense, a mais rica do mundo, tem uma vizinhança incômoda e pobre bem ao seu lado, o tempo todo: o México!.. Para uma mulher do filme canadense O segredo do quarto branco “o mundo todo é uma cozinha.”  Outra personagem do mesmo filme afirmou que “as coisas lindas não são práticas.”
Não me sinto oprimido pelas melodias das catedrais. Na Catedral da Imaculada Conceição de Montevideo foi instalado um sistema de som pelo qual ouvi músicas dos séculos XVIII e XIX enquanto visitava suas naves e retábulos e nichos e tumbas. Ali parecem querer me ensinar a fazer o melhor da morte e a postergar a ruptura do ovo de ouro. (?) Hoje à tarde passei ouvindo e vendo shows de Frank Sinatra. Isto porque minha mãe me contou que já tenho 2 primas  vivendo nos States.
Nos campos das culturas brasileiras as chamadas “esquerdas” imperam absolutamente tentando alijarem autoritariamente todos os corpos e objetos não identificados, todas as vozes dissonantes, como se o melhor e o mais enriquecedor brotasse do monólogo num deserto. Como disse Olavo Carvalho no programa Passando a limpo do Boris Casoy, temos uma cena cultural monopolizada e centralizada pelas esquerdas numa economia e numa sociedade cada vez mais influenciada e orientada pelo capitalismo globalizante, como se fosse possível termos duas morais, uma para a arte e outra para a vida. Os que defendiam este dualismo moral foram os fascistas. Foram? Para Pasolini a democracia cristã hegemônica na Itália - pós Segunda guerra é uma prova inequívoca de que o fascismo não saiu derrotado no fim desta hecatombe militarista e bélica celebrado entre Maio e Agosto de 1945.
No fundo, estas esquerdas também fazem o jogo de cintura da indústria cultural massificante. A minha utopia religiosa é o amor aos animais(entre eles incluindo os animais humanos, claro!..) e já aliciei pessoas em favor desta linda causa. Para o romancista e professor João Gilberto Noll, a grande religião americana é a que se satisfaz com a realização contínua de avanços tecnológicos num continuum no qual a utopia se faz carne – máquina, nos trazendo a sensação de que os nossos sonhos e metas tenham sido concretizados, o que explicariam as visões estadunidenses sobre o fim da história. E assevera J. G. Noll: “Eu  acho que nós estamos vivendo um momento lacunar, um momento de impasse profundo. Acho que é preciso colher a substância desse vácuo. Não adianta você querer preencher esse vácuo com aderências, com aditivos espalhafatosos porém postiços. É por isso que a ficção tem que se confrontar com o chamado irrelevante, com essas sementes do próprio vácuo, com as intercessões, com os intervalos. Penso que a obra literária, a obra estética, deve apresentar um convite para você beber de um fermento ainda ideal mas que quer se fazer vivo, concreto, efetivo, no corpo mental e afetivo de cada um, no plano físico.”
Discordo dos que negam os valores todos os valores consagrados no passado como se os temessem voltando no presente. Para mim os avanços humanos e civilizatórios não se darão com a simples e infantil recusa em lidar com o passado que vive e pulsa em cada um de nós. Sempre seremos filhos do passado. Só os robôcops estão livres de memórias e do passado. Só para estes seres mecânicos e eletrônicos a memória é virtual. Para mim é pura hipocrisia esquerdista a negação simplista da “odisséia da família” ou o desprezo pelas “almas que faltam no presente.”
Na verdade, em plena informatização do “real”, o grande espetáculo humano contemporâneo não tem mais as ruas dos flaneurs baudelaireanos como cenário. E para ser mais exato, não existem “anônimos”, ninguém se considera anônimo. Por isso temos até reis e rainhas da cocada preta. É o stablishment quem cria a figura sem alma do anônimo, o ser que existe sem subjetividade reconhecida, o indivíduo massificado. Entre na rede que se esparrama também pelas ruas e você verá que cada um tem o seu nome, o seu perfil e a sua identidade. Ouviu J. G. Noll?  Como disse Caetano Veloso em seu disco Uns, “ninguém é comum.” À meia-noite comerei as ameixas que o Walter me trouxe de uma fazenda do sudoeste mineiro. “Sobre seus ossos o presente é eterno.” (Octavio Paz).
Segundo Noé Jitrik a idéia de “cânone” estético -literário não pode desvincular-se da marginalidade enquanto âmbito ou postura anti-normativa. Já Nicolas Rosa (ambos são críticos argentinos) acha que o “cânone” deve ser visto como o preço simbólico que os escritores pagam a seus antecessores textuais. Outra ensaísta platina, Maria Teresa Gramuglio, deplora o panorama sombrio das nossas letras, a hegemonia de uma comunidade narrativa capturada pela convenção canônica, capturada pelo estabelecido, pelo quase-escolar.
Mireille foi uma prostituta da rue des Moulins na Paris do fim do século XIX e a modelo amada e preferida pelo pintor Toulouse Lautrec. Convencida por comerciantes de carnes vindos de Buenos Aires para passeios e aventuras em Paris, ela migrou para a capital argentina. Deixou Lautrec tão desolado que este boêmio artista parisiense até paralisou a pintura da tela na qual retratava o bordel da rue des Moulins onde vivera Mireille. Quem nos conta esta história é Julio Cortazar em Un gotán para Lautrec . Cortazar foi um dos animadores do jogo de espelhos entre Paris e Buenos-Aires. Na capital portenha, Mireille se transformou na lendária Rubia Mireya, resgatada, pela primeira vez, por Manuel Romero, autor da letra do tango Tiempos viejos.
Fiquei estarrecido ao ler no caderno Cultura y nación do jornal argentino Clarin uma entrevista na qual Leônidas Lamborghini revela o seu peronismo esquerdista. Troquei correspondência com este ex- exilado escritor argentino em 1998. Para mim foi uma desagradável surpresa!.. Sinceramente..  Acho que o confundi com Osvaldo Lamborghini. Só pode ser isto!..  Continuando com as novidades platinas, Sylvia Saitta e Luis Alberto Romero, em livro recentemente lançado em Buenos Aires, Grandes entrevistas de la história argentina, esqueceram de citar as entrevistas feitas pelos editores da revista Crisis nos anos 70 do século XX.  Esquecimento? Ou... ..
Mamãe eu quero.. mamãe eu quero.. mamãe eu quero mamar..  pórtico de um cemitério de uma cidadezinha do interior de Goiás: “Nós que Aqui estamos por Vós esperamos!..”... AAHHH!!...Uh!.. A assombração!.. a assombração!.. terminou a música de Chopin.. um lindo noturno!.. Tiau..
A água, o vento, a pedra, o musgo, a árvore, o silêncio, a efemeridade da vida, a morte.... “As sombras e os sonhos têm o mesmo peso.” – Yves Bonnefoy. Até as moscas fazem amor? Você sabia que Jeremy Benthan defendeu a necessidade egoística de todos virem a ser embalsamados e acolhidos em monumentos auto-icônicos para si mesmos? Leiam o romance O sensualista da escritora canadense Barbara Hodgson. Esta romancista assim descreveu o corpo de um de seus personagens: “uma orquestra inflamada de ferroadas, coceiras e espasmos”. Minha obra-prima já tem um título: História dos cheiros humanos. Porque cada vez mais nos comunicamos melhor com outros animais do que com os animais humanos?  A banalização da morte e da vida estão ocorrendo concomitantemente. As vidas anônimas já extintas e esquecidas, consideradas sem importância no curso das mudanças históricas, deram consistência carnal aos grandes acontecimentos do século XX.  Não foram apenas molduras para os grandes vultos políticos, intelectuais e econômicos do século XX, esta é a hipótese do pesquisador Marcelo Masagão, diretor do filme Nós que aqui estamos por vós esperamos . Conectando macros e micros histórias de poder no plano institucional e no plano do cotidiano, Masagão vê anônimos, ilustres ou vips como partes de um  mesmo processo. Baixeza e grandeza são dois parâmetros congêneres, assim como pobreza e riqueza, miséria e opulência. Parâmetros sempre indissociáveis. Não só na curta história do século XX.  Deste mosaico informe e caótico de imagens cinematográficas, de telejornais e de fotografias este cineasta resgata o recheio humano e onírico da história bem como o fascínio pela morte do Outro, a tendência novecentista à destruição, o fluxo da pulsão de morte em meio às danças e alegrias dos anos 20 e 60 do século XX, em meio a Hiroshima pós- bomba atômica e aos montes de lixo do mundo inteiro. A faixa literária gay trata do sublime e das glórias e êxtases do cotidiano? Da apropriação de bens supremos dos quais ninguém até então se apropriara?  Aos climas de capas e espadas devotados às paixões? Falésias, fiordes, serviços de correios entre cumes passionais sem futuro nos locupletam com cargas intensas e insuportáveis de comichões existenciais. A contemplação da vacuidade seria a grande marca da efêmera contemporaneidade? Os homens considerados loucos andam em círculos e as baratas correm em círculos para não serem massacradas pelo racionalismo retilíneo e estratégico dos normais. Como encarar a insignificância universal ou a evaporação do sentido? Voltando a falar com os nossos fantasmas? Ouvindo os libertinos sádicos ou volvendo à acídia dos monges medievais? Submetendo-nos aos demônios do meio dia? Vivendo em contínua insatisfação na qual não amamos mais ninguém?  Conhecer a agitação sem objeto? Desgostar-se ou amar a si mesmo? “O niilista moderno, Narciso infeliz, olha no fundo da água sua imagem feita em pedaços.”— Octavio Paz. “Lancei-me na libertinagem. Mas não amo nem gosto da libertinagem”, assim escrevia o personagem dostoievskiano Stavrogin à sua também dostoievskiana Daria Pavlovna em Demônios ou Possuídos.  “O Homem, criatura improvável, pode salvar-se em qualquer momento.” — Dostoievski. Abjeto a impassibilidade filosófica. “Todos podem salvar-se ou perder-se.”— Octavio Paz. Os seres insólitos como os santos, as prostitutas ou prostitutos, os promíscuos, os justos e os criminosos, os livres e os agraciados são sobre-humanos deslocados de seus tempos e espaços. Entes do mundo pré-industrial, anjos barrocos ou orgiásticos cortesãos. “Os sectários não herdaram dos niilistas a lucidez, mas a incredulidade.”— Octavio Paz. Dostoievski e eu chamamos os sectários de endemoniados. São como  os porcos citados no Evangelho-São Lucas, VII, 32-36 — aclara Octavio Paz. Para o personagem dostoievskiano Dimitri Karamazov, “devemos amar mais a vida que o sentido da vida.” Para Dostoievski a realidade das idéias lhe trouxe alguma dimensão religiosa para a sua existência. O nosso coração é um micro motor que pulsa Deus em nós, nosso cérebro é uma máquina movimentada pelo Diabo.
“A consciência da cisão é diabólica: estar possuído significa saber que o eu se rompeu e há um estranho que usurpa  nossa voz. Esse estranho é o Diabo ou nós mesmos? “ — Octavio Paz. Descrições de processos psíquicos nos remetem a especulações metafísicas e estas nos sugerem buscas religiosas que amalgamam o sobrenatural com o rotineiro, o ridículo, o exótico, o sentimentalismo e o amedrontante. “Os diabos modernos fazem todo o possível para deixar-nos saber que vêm de lá, do mundo subterrâneo”. — Octavio Paz. Os diabos dostoievskianos vêem o parentesco oculto entre o mal e a enfermidade, entre a possessão e a reflexão, observa o Prêmio Nobel de Literatura de 1990 e o mais interessante dentre todos os grandes escritores mexicanos do século XX. O triunfo do racionalismo argumentativo do Demônio bem como sua auto-negação sofismática se torna ainda mais aniquilador se reconhecermos que para acreditar no Diabo não necessitamos acreditar em Deus!... O azeite espermático está entre os óleos que melhor untam a máquina da história do cotidiano humano, alcançando até as altas engrenagens da história institucional da nação mais poderosa no mundo atual. Refiro-me ao caso Bill Clinton com Mônica Levinsky. “Há uma espécie imune à sedução do Diabo: o idéologo. É o homem que extirpou a dualidade. Não conversa: demonstra, doutrina, refuta, convence, condena.”  — Octavio Paz. Como Dostoievski, amo os humildes e sinto nojo dos pretensos salvadores salvadores dos pobres. Por isso, Lênin disse a respeito de Dostoievski: “Não perco tempo com esse lixo.” Os regicidas que vencem Césares com punhais não vencem o sistemático e impessoal despotismo ideológico, nos escreveu Octavio Paz. Que completou: “Não se pode assassinar uma abstração.” Ameaçado pela crítica, o déspota ideológico monologa como o faz Fidel Castro em seus prolixos discursos autoritários que duram mais de cinco ou seis horas contínuas!..  A tirania do solilóquio dos sádicos professores e pedantes continua hegemônica  na mesmice universitária e escolar brasileira, latino-americana talvez.  Por tudo isto, a obra de Dostoievski é atual do ponto de vista político e moral. Dostoievski nos ensina, conclui Octavio Paz, que o homem é uma criatura imprevisível, escapa a todas as definições e prisões.
Nenhuma continuidade permeia permeia a história da expressividade humana. Nossas linguagens dependem tanto de nossas micros e macros histórias. Arte visual é como artesanato amoroso?  Quando analisamos os outros deixamos de ser éticos.  Quando ficarmos livres dos nossos cabelos, símbolos sansônicos de força, estaremos mais saudavelmente ajustados às nossas frágeis condições humanas, disseram Dostoievski e Rodrigo Naves.  O Brasil há muito tem sido  uma terra do salve-se quem puder. Não foi Fernando Henrique Cardoso que aqui instalou esta barbárie e nem será ele sozinho quem a deterá.  “Todo poeta está sempre começando.” — José Castello. O espontâneo leva só ao conhecido? Para Luiza Mendes Furia, de Caçapava / S.P. , “escrever é repetir. ; “a poesia está muito influenciada pela Universidade. Essa não é a minha área.” ; “ o lirismo parece fora de moda.”; “ hoje em dia as pessoas são muito críticas, são muito sarcásticas, e eu sou meio delicada.”. Ignorar a obra de Miguel Torga é um dos crimes da ignorância. Não ler, não comentar mais e esquecer o romance Cidade de Deus do antropólogo carioca Paulo Lins é, no mínimo, muito estranho. Seria como deixar de falar de Machado de Assis ao se referir ao panorama literário brasileiro no fim do século XIX.
Amo os cachorros feios, furiosos e abandonados. Os Blomberries e a sociedade intelectual dos apóstolos irreverentes formaram o grupo que mais perturbou a decadente cultura inglesa vitoriana. O refinamento dos rituais católicos também fascinou James Joyce. Dostoievski apegou-se mais à ética liberal católica. Para Joyce era a música, e não a poesia, que melhor fazia uma crítica da sociedade. Isto desde as cantigas provençais e de outras origens no cotidiano da Europa medieval. As experiências “eucarísticas” joyceanas foram suas fontes de criação literária, além da sua erudita formação. Ele gostava se descobrissem sua inocência essencial e, sob máscaras, escondia a simplicidade humana que subjaz em todos os seres humanos mascarados. Sua esposa Nora Barnacle deu-lhe a segurança necessária aos que decidem ser severos com o mundo.  Muitos poemas de James Joyce foram musicados.  Amor e música, amor e cor, tardes, ventanias, bosques ensolarados, amor triste à distância, amor no sol a pino, virgindade,, sexo e eucaristia, coprofagia, ciúmes, desonra, altivez,, purgação e criatividade, lembranças, rumor de águas, galope de cavalos, seres da natureza se exprimindo como no filme Aurora  de F. W. Murnau, escrita fragmentária como no romance A vida e as opiniões do cavalheiro Tristram Shandy de Laurence Sterne são alguns dos genes do código literário e do imaginário subjetivo de James Joyce.  Seus arquétipos : o útero, o prazer solitário, o gozo, a guerra e a morte. Alusões à lua de capuz, a antigos plenilúnios, passeio com Mary Sheehy às colinas de Dublin, a epifanias de sonhos, espumas nos joelhos de cavalos guerreiros, chicotes flutuantes, armaduras negras e sombrias, leituras de  textos de William Blake e de Walter Scott, debandadas, amor à religião, à pátria e à família e resgates do atemporal são alegorias e paixões e simbologias marcantes na história da obra escrita de James Joyce, escritor irlandês tão admirado pelos poetas Ezra Pound e Augusto de Campos e Décio Pignatari. Preferiu Joyce que o acompanhamento musical dos seus poemas fosse feito por alaúdes. Na falta de alaúdes, por violões.  O vórtice da gargalhada, o escuro onírico e o fulgor que cega, a bigorna que martela em seu peito, longas e verdes cabeleiras sacudidas triunfalmente, cavalos belicosos emergindo do mar, aos berros correndo por praias... Coração, não tens prudência nenhuma, com tal desespero? Select Saloon Bars Cassidys .. o verde submarino é a cor mais profunda embora se assemelhe à da superficialidade dos musgos. Oh grande irlandês!!.... Protestou contra si mesmo!..  A fidelidade é uma postura medieval e feudal, a traição e a ironia têm um quê de modernidade. “Não podemos nem prometer nem esperar a vassalagem eterna porque reconhecemos de modo assaz exato os limites de toda energia humana.” – James Joyce. Para este genial irlandês a arte é essencialmente elíptica. O artista, para Joyce, é um sacerdote da arte. A técnica joyceana de escavar continuamente buracos anais na cultura inglesa e de esculpir erráticas ficções labirínticas e autobiográficas, suas datações e classificações inexatas ou aleatórias, suas abundantes citações de clássicos deslocadas de seus contextos, instalam em nós o vazio consciente de nossas pretensas sabedorias. Para Jacques Lacan, James Joyce livrou-se da psicose enveredando-se ou mergulhando no rio da arte. Para Jung, Joyce mergulhou até o fundo de um rio sombrio e infernal. Sua filha Lúcia (de Lammermoor?) despencou e se afogou neste mesmo rio.  Para James Joyce, a Psicanálise era um tipo de chantagem ou de charlatanismo intelectual. E agora? Perdi o rebolado. “Tudo tem a ver com tudo se você tem os seus olhos abertos.” — Arnaldo Antunes. Viva Carmem Miranda! The End.

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O autor está aceitando adesões para fundar o Centro de Expressões e Estudos sobre Imaginários e Mentalidades e Tendências Contemporâneas. Entrem em contato via mail.

 

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