Ponho
minha adolescência na carcunda e desço a 24 de Outubro em
direção à Praça Joaquim Lúcio. Nesse
momento sou todo Campininha. Abro a porta de minha sensibilidade e caminho
por esta rua histórica, que leva o nome da data da fundação
de Goiânia. A 24 de Outubro que vejo é a vitrine de meu bairro,
e por isso ando por ela com a maior familiaridade, pois conheço
todo mundo, sei o nome das lojas e dos proprietários. Saindo de
minha casa na Benjamim Constant (eu digo para as meninas que moro na beija-me
constante!), dobro a esquina da Casa Central, de Simão Hamu e vejo
do outro lado o Posto Texaco do seu Albino, onde trabalhei e fui despedido
porque jogava bola e chegava sempre atrasado. Descendo, pela calçada,
vejo a sapataria do sr. Falcão, o Bar Cacique, onde fui preso por
jogar sinuca. Na seqüência, a residência do fotógrafo
Eduardo Bilenjian, primeiro fotógrafo de Goiânia, e a Casa
Bonach, de Otto Waldemar Bonach, já na esquina da rua Rio Verde.
Após o cruzamento, uma seqüência de imagens inesquecíveis:
a Casa Daniel, de Daniel Kakov, a Farmácia Rodrigues, do sr. Dimas
e seu filho Pitágoras, a Relojoaria Mundim, o Cine Campinas, o Bar
do Chiquinho, o Hotel Avenida, de Dona Nenzica, mãe de Zanoni de
Oliveira, a residência de Galdino Siqueira, pai da escritora Célia
Arantes, e o Lídice Bar, de Agenor Chaves, onde se fabrica
o mais gostoso picolé de coco queimado. Na parte de cima, a Casa
Mineira, do sr. Saium, o Bar do Chico, de Francisco Lopes de Oliveira,
a residência do Cel. Sarmento, e o sobradinho do Filhinho Alfaiate
(Benedito Soares de Castro) e a farmácia do seu Augusto, quase na
esquina com a Quintino Bocaiúva. No quarteirão que se segue
até a rua Jaraguá, vejo, na esquina, o Negrinho Alfaiate,
que com suas idéias revolucionárias, chegou a ser preso após
receber a visita do camarada Luiz Carlos Prestes. Em seguida, a Sapataria
Sobrosa, a residência de José Hermano e dona Sanina, a Santa
Sanina do Lar das Meninas Santa Gertrudes. Como estou caminhando pelas
ruas de meus sonhos, tento relembrar tudo, e o Bar do Fiori vem surgindo
cheio de atleticanos boêmios. Nesse bar ficou dependurada, como relíquia,
a xícara em que o então governador de São Paulo, Ademar
de Barros, tomou um cafezinho. Agora estou diante do Bazar Paulistinha,
do amigo e cronista Bariani Ortêncio, vizinho da Casa dos Bons Negócios,
do sr. Albano, onde o mano Gilberto foi balconista. No outro lado da rua,
as residências do dentista Amorim e do sr. Bernardino Rosa. Em seguida,
a Casa de Saúde do Dr. Rassi e o bar do sr. Tuis Barbosa, com suas
várias mesas de sinuca. Após o cruzamento da rua Jaraguá,
à esquerda, a residência do sr. José Marques, pai de
Silvio Marques, o atleta que disputou com este cronista a liderança
de São Silvestre corrida no dia 1º de maio de um ano que ficou.
Bem nas proximidades da Praça Joaquim Lúcio, a casa onde
funcionam três cartórios: do Djamil Pacífico Barbosa,
do Luiz Sampaio e do Flórido do Prado, o tio Nhozinho, e ainda a
Casa Thomé, pela direita, a residência do sr. Permínio
de Albuquerque e o Bazar do Ipanema. Já na esquina da Praça
Joaquim Lúcio, a Paris Calçados e a lojinha de Geraldo Sóter
(hoje, no local, o edifício do Cartório Antônio do
Prado, do primo Toninho, cracão de bola, o mestre Ziza com seus
dribles desconcertantes e passes sob medida). Após, o bar do Pão
Duro, a barbearia do Milton e do Giló, a Tabacaria O ponto, de Irineu
Müller, onde sou balconista eterno, o Bar Esportivo, de Orlando Ferezin,
o bar do Facundo Pinto e o antigo prédio da esquina, onde por muitos
anos funcionou o velho Cine Campinas.
Acho melhor parar por aqui. O barulho dos carros, a poluição,
e tudo virado ao avesso me atormentam. Ainda mais, a saudade insiste em
lacrimejar meus olhos!
José Mendonça Teles
Do livro: "Crônicas da Campininha", Ed. Kelps, 1996,
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