Leituras de uma Paisagem
– O Recife
Para alguém que vem de fora o Recife, é...
Um retorno na história, uma viagem no tempo, sem perder um toque de modernidade.
Não é por causa dos prédios e monumentos, fachadas coloniais, fortes e canhões, mercados, museus e tudo mais.
A história do Recife está em seu povo, homens e mulheres, comuns, gordos, magros, desempregados, empresários, ambulantes.
Pessoas com sua forma cantada de falar, um jeito esperto e apressado de viver e ver o tempo passar sem nada a fazer e fazendo mil coisas ao mesmo tempo para sobreviver.
Pessoas de pele cor de canela, olhos agateados, mistura nobre de índios e negros com uma pitadinha de estrangeiros um calidoscópio de gentes.
Pouca roupa para suportar o calor sem perder algo de só seu no vestir, bermudas para todos e homens eternamente com suas camisas entreabertas permitindo-se a liberdade sóbria, o bronzeado dos corpos dourados faceiros, tantos outros com paletós jogados nos braços, um coco gelado na mão, um olhar sobre a margem da aurora para do sol pontilhada de histórias.
Negros mestiços, com sua vocação histórica de embalar tabuleiros no sobe e desce das ruas, tão natural, o antigamente de hoje, no jeito suado de levar vida ao prazer da brisa morna.
No cheiro agridoce das ruas que exala por quarteirões e se renova com outros aromas fazendo um labirinto de cheiros no ar, a cada passo, bancas de frutas abacaxi e ameixas, cajus, mangas uvas de todas as cores o aroma que é liberto pelo Capibaribe que torna a todos tão livres saboreando seus doces seus cheiros, sabores, pelas ruas, pelas lojas, nos ônibus recostados, andarilhos, usufruindo, do doce direito tropical de saborear saquinhos de frutas picadinhas, pipoca, bolo de rolo, tapioca, bolo de goma, castanhas e amendoins quentinhos vendidos dentro dos ônibus a qualquer momento em todos os cantos. É tão natural.
Há tanta diversidade nas ruas os cheiros exalam, recendem, embriagam misturam-se com os fest-food's das pizzas, do hamburguês, e shushi ‘s com a melodia das vozes ecoando num burburinho quente, crivando-se nas mentes num cenário lúdico, belo, exótico.Nosso, que é a soma de todos os que de alguma forma nos forjaram em únicos.
Camelôs, bancas de sebo, antiguidades, raridades, novos piratas, genéricos, similares, nas ruas nas lojas no chão, nos carrinhos de mão, tudo bradado ao vento como lembranças de Nassau viajante dos tempos, tudo praticamente igual, um jeito singular de guardar no presente um que do passado.
Mas mesmo assim perdemos algo muito especial pelo tempo, crianças que vendem de tudo, esmolam pelas ruas e tantas outras colam seus futuros no êxtase do agora, em traseiras de ônibus cortam as ruas dependuradas, sem pátria, sem medos, sem sonhos...
É no balanço da maré, frevando em liquidações anunciadas em sofreguidão, é o povo do jeito que é, nem melhor nem pior, apenas povo.Que vestem as mascaras da alegria e nunca as despe.
O Recife é assim, só um tempo dado ao tempo, com pinceladas de história, utopias, sonhos construídos sobre as águas, problemas conjunturais e soluções “in-reais”.
Só estando aqui, debruçando-se no parapeito das pontes, vendo o sobe e descem dos caranguejos na maré, as garças plácidas com sua elegância competem com os pescadores no leito meigo que acariciam suas pernas na velocidade do arrasto das tarrafas, as vozes ao vento, só assim, se pode sentir o Recife.
E como as pontes que abraçam tuas ilhas e te faz Recife. Abraça-me e recebe-me com teu calor. Tantas vezes a saudade me trouxer pelo braço.
Gleise Costa