CIDADES BRASILEIRAS

 

CONTEMPLAÇÃO  

          Estou em Ubatuba, na praia do Tenório, dentro d'água, contemplando o céu, o mar e as montanhas. Não se vê o alto-mar, estou cercado de montanhas por todos os lados; por isso as águas são verdes: as montanhas cobertas de árvores verdes refletem-se nelas. Há uma tal paz, o céu muito azul, as nuvens esparsas muitos brancas, e o vai-e-vem das ondas me levando, me embalando: tudo é um apelo à paz.
          Não vejo o mar se encontrando com o céu, mas sei que um e outro são infinitos. Lembro, involuntariamente, juro que foi involuntariamente, lembro Pascal e o silêncio eterno dos espaços infinitos que o aterrorizavam. Estou fascinado por essa grandeza imensurável que chamamos de infinito. Estou maravilhado por esse tempo fora do tempo, esse não-tempo, que chamamos de eterno.
          Caio de joelhos, no fundo da água clara, límpida, diante da solidão cósmica – que cai sobre mim. A ciência não encontrou notícia de vida em nenhum planeta, dentre todos os planetas que giram em torno das estrelas. Tenho todo o cosmo sobre os ombros. Não pesa mais que a mão de uma criança ou a mão de Deus, que não têm peso, mas eu sucumbo.
          Onde o fim do universo? Seria infinito? Existe um tempo que não pode ser medido, a que chamamos eternidade? Esse seria o tempo de Deus. O tempo dos homens, nós o medimos. Arbitrariamente, mas o medimos. Somente Deus, que não se submete à matéria, está livre da escravidão do tempo. Nós, homens limitados, não podendo conhecer o eterno, pensamos no infinito: parece mais fácil de ser concebido.
          Cheguei a falar, acima, do mar como infinito. É a sensação que temos. Faz parte do globo terrestre em que vivemos, é limitado como nós somos limitados. Mas o universo, onde os seus limites? Mais longe vai a imaginação, em busca da última estrela, infinitamente distante, mais perto chega da eternidade. A maior distância que podemos conceber, a ilimitados anos-luz de tudo que podemos medir, só pode se chamar eternidade.
          A beleza do mar e do sol, da areia, das águas claras, verdes à distância, com as montanhas verdes dentro, sem que eu o perceba, traz-me à mente a idéia de Deus. A prova de que Deus existe. Se eu posso conceber uma noção de eternidade, tenho que conceber a noção de Deus, senhor dessa eternidade.
          Como suporto a solidão cósmica sobre os ombros? A mão de uma criança ou a mão de Deus. O silêncio eterno dos abismos do universo? O espírito de Deus paira sobre os espaços infinitos. A ciência me prova que a última estrela repousa na mão de Deus. Antes da explosão inicial, havia o sopro de Deus.
          O meu corpo vai e vem sobre as águas calmas, tão perto da terra e tão perto do céu, leve como uma pluma, leve como o espírito que sopra sobre ele.

José Carlos Mendes Brandão

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