Esta é a última que te escrevo como
estudante. A`estas horas estarei bacharel em ciências jurídicas
e sociais — doutor Lobato! A sensação há de ser
a que me causou a primeira calça comprida. Que vergonha de todo
mundo, meu Deus! A impressão era de que o universo inteiro cravava
os olhos em mim e sorria ironicamente. Adeus. Receba lá o último
abraço do Lobatinho que vai ser guilhotinado ao meio dia — e por
antecipação receba também o primeiro abraço
do breve e grave Dr. Monteiro Lobato.
LOBATO
P. S. – Veio de retorno o meu Nietzsche. Chegou
bem de viagem e através das notas marginais disse-me que... que...
que só te procurará em novos volumes alguns anos mais tarde,
depois que o meu amigo Rangel amadurecer um pouco mais. Impertinente este
alemão, não é verdade?
Emerson é americano — e grande. Estou
à espera de Representante Men. O seu ensaio sobre a Narueza ensinou-me
algo bastante curioso: se você olhar uma paisagem por entre as pernas,
quero dizer, com os olhos de “cabeça para baixo”, a paisagem fica
uma coisa nova. Experimente.
Do livro: “A Barca de Gleyre” – Quarenta anos de Correspondência literária entre Monteiro Lobato e Godofredo Rangel – 1º tomo, Ed. Brasiliense, SP, 1957
Monteiro Lobato