Para meu filho, que faz doze anos
Abelzinho:
Já há muito tempo desejei escrever algo especial para você, abrindo meu coração, derramando tudo o que sinto em forma de palavras, mas... até agora elas pareciam se recusar a sair da cabeça e do coração para ir parar no papel. Não sei porque, já que já escrevi tanto, para tantas pessoas... talvez seja porque minha linguagem com você passa mais pelo toque, pelo abraço, pelo beijo, pela “enroscada”, pela fungada no cangote... Mas acho que chegou a hora. Se não conseguir dizer tudo, pelo menos tentei!
Você é especial. “Veio do céu”, como diz sua avó, sem planejamento nosso, mas com certeza num projeto bem desenhado de Deus. Numa gravidez complicada, você já era apressadinho, impaciente. Imagine, querer nascer com 5 meses, quando todo mundo espera 9? E depois de todo esforço que fizemos, Dr. Slaib, seu pai e eu, além das orações de todos que já lhe amavam mesmo antes de lhe conhecerem, só conseguiu ficar na barriga até quase 7 meses. Se a gravidez foi difícil, o parto, então... Foi das poucas vezes na vida em que tive medo de verdade. A sala fria, eu sozinha, esperando que tudo acontecesse, e ouvindo ao longe comentários nada animadores, do tipo: “eu quero fio fino, vocês me dão essa corda pra suturar uma cesariana???” “já desinfetaram a sala? Cadê o álcool?” E antes da cirurgia, dr. Bira, o anestesista me explicou que não ia dar a dose certa de anestesia porque você era prematuro e estava com dificuldades de manter o ritmo cardíaco. Então, como eu era maior e mais forte ,! podia agüentar um pouquinho mais de dor para que a droga não afetasse você. Na hora, respondi que tava tudo bem, mas não fazia idéia do que seria uma cesárea com menos anestesia que o normal... E na hora “H”, quando dr. Bira que estava ao meu lado chamou o obstetra: “Zé, corre aqui que a pressão dela está sumindo, anda rápido!” E a resposta: “Se eu parar aqui, perco a criança!” Dá pra imaginar?
Depois de tudo acabado, receber você ao som do “Soneto da Fidelidade” (Dr. Slaib parecia ter nervos de aço, sangue frio ou sei lá o quê!) só podia agradecer ao Pai por você ter chegado, finalmente! Algumas horas na encubadeira e logo estava em meus braços, e eu com a difícil tarefa de lhe dar de mamar. Naquela hora, não tinha a menor idéia de que essa tarefa se mostraria cada vez mais dura com o passar dos anos! Mas no começo, quando tudo é novidade, a gente até se diverte.
Você não ficou um bebê para sempre, graças a Deus, seguiu se desenvolvendo sem qualquer seqüela das dificuldades da gravidez e do parto. Mais um milagre!
Que criança doce você foi se mostrando! “Aprontava”, mas quando a gente olhava pra dar a bronca, você abria um sorriso e desmontava a gente. Não vou dizer que esqueci a torneirinha de lágrimas que se abria ao menor sinal de uma bronca, pois seria tentar esconder o sol com uma peneira. Mas em alguns momentos, quando eu esperava as lágrimas, elas não vieram. Como no primeiro dia de aula, em que você entrou tranqüilo, e nem deu tchau... Só quando eu chegava pra dar aula de música na Escola Degrau, você queria colar em mim, e aí, como é que eu ia embora?
Na escola, se não era o preferido das professoras, era muito querido por elas. Basta lembrar de tia Ana Lúcia, tia Lourdes, tia Adelinha, tia Sinara, tia Rita Suely, tia Rita Santana, tia Joilda, tia Regi, tia Teca... todas “babando” você. Você, que parecia elétrico, não parava um minuto sentado na carteira, mas com seu famoso sorriso escapava das broncas na escola também. Lembra de quando você trocou de sala, se oferecendo a d. Adélia, só pra não ganhar anotação na agenda por ter esquecido o dever de português? Ah, menino!,,,
Você sempre foi o “amigo” de papai, mas pra mim, é meu “neném”. Lembra quantas vezes eu perguntava: “Você vai ter vergonha de beijar mamãe, de sentar no colo, na frente de seus amiguinhos?” E você respondia que não, nunca. Mas o dia chegou! Na festa do dia das mães deste ano já senti sua mão (não tão pequena) querer discretamente se soltar da minha na hora de entrar na escola. E depois aquele comentário que nunca vou esquecer: “Mãe, já entrei segurando sua mão, já lhe levei até à sala, sentar no seu colo é demais!”. Tudo bem, mãe é assim mesmo, de vez em sempre faz o filho pagar um mico, até um king Kong.
Alguns diálogos ficarão para sempre na minha memória:
“- Você sabe que eu te amo? -Sei. -Mas quem lhe disse? Era segredo!
-Você. -Eu? Quando? -Todo dia!”
E o da hora de dormir:
“-Boa noite! Boa noite! Deus te abençoe. Amém. Eu te amo. Eu também.”
Que depois se transformou em: ”Todos a bordo? Sim, Senhor. Boa noite, senhor. Boa Noite, senhor” em tom militar.
Você está fazendo 12 anos. Entrando na adolescência... jamais quero dizer “aborrescência”, pois só quero abençoar você, nunca amaldiçoar. Está começando a sair sozinho, ir e vir da escola, escolher fazer curso de LIBRAS, andar de ônibus, escapulir para o comércio depois da prova... tudo isso faz parte do crescimento. Mas você não pode esquecer da orientação da Palavra de Deus: “Vós filhos, sede obedientes a vossos pais no Senhor, porque isso é justo” e “Honra a teu pai e tua mãe, para que te vá bem, e vivas muito tempo sobre a terra”. A Bíblia ensina a obediência, mas como diz aquela música que você cantava com seu pai, “honrar é mais que obedecer”. Um filho honra os pais quando se torna digno da confiança deles. Quando é o mesmo, esteja perto ou longe dos pais. Quando gera comentários que alegram o coração dos pais, por exemplo: “gosto tanto quando ele vem aqui”, ou “ele é tão educado”, ou “pode deixar, ele não dá trabalho”. Graças a Deus, você tem honrado seus pais. Com o! criança, como pré-adolescente, com atitudes próprias da idade, errando e sendo corrigido, acertando e sendo elogiado, você é uma bênção em nossas vidas.
Sua companhia me faz bem! Sua imaginação, mais do que fértil, é uma viagem! Seu abraço me conforta, seu cuidado comigo quando estou doente me mostra que amor é atitude, e não somente carinho ou palavras.
Meu amor, Deus abençoe seu futuro! Seja um servo de Deus, fiel e esteja sempre no lugar certo para receber as bênçãos que Deus tem pra você: No centro da vontade dEle. Oro por você, pela escolha de sua profissão, por sua esposa, por sua saúde... Sei que minhas orações estão sendo ouvidas “e como é pra mim, sim, Deus há de ser, exemplo e a razão do seu viver. Vida de minha vida, alma de minha alma, estrela cadente, presente de amor sem fim. Quero te ver crescendo, cada vez mais sorrindo. Meu filho amado, pedaço de mim...” (digo como Milton Nascimento: “certas canções que ouço cabem tão dentro de mim, que perguntar carece: como não fui eu quem fiz?”)
Muitos outros aniversários virão, é o que eu desejo, mas isso não nos cabe decidir ou mesmo afirmar. Se vierem, certamente terei outras coisas a lhe dizer. “Algumas coisas mudam... outras nunca mudarão”. Uma dessas, que nunca mudarão é que EU AMO VOCÊ. Lembre-se disso, se por acaso um dia você duvidar.
Mamãe
Anabel Cavalcanti