Milão, 9 de março de 1909

Meu caro Neto,

          O livreiro Floury, de Paris, bd. des Capucines, 1, já deve ter remetido para o Rio, com o teu endereço, porte pago, a edição de Balzac. É a edição Calman Levy, em 25 volumes; quando saí de Paris, há vinte anos, estava sendo acabada a encadernação.
          Há outras edições mais ricas; esta, porém, é a integral, a única completa, contendo, além de todos os romances, o teatro, a correspondência, as polêmicas, os panfletos, e a história do labor literário do monstro. Guardarás esses volumes como uma lembrança de nossa velha e boa amizade. — Depois de uma semana em Nice, estou errando pela Itália, onde vim encontrar inverno mais duro do que o de França. Anteontem atravessei o Apenino toscano entre altíssimas paredes de neve. O espetáculo era maravilhoso à noite; o luar animava prodigiosamente aquele mundo branco, e passei a noite a imaginar coisas fantásticas — avalanches, nixes, kobolds, deuses e deusas de carnes fúlgidas, poemas de Wagner — o diabo! A alucinação só se desfez ao romper do dia, graças à intervenção enérgica de um grog quente, no wagon-bar. O que é espantoso é que o meu reumatismo, tão cheio de 'partes' quando fustigava o frio (?) do Rio de Janeiro, agora nem dá sinal de vida: queria um castigo, o ladrão! Para a semana devo estar de novo em Paris; escreve-me para lá (Consulado, rue Cambom 51) dizendo-me se os livros chegaram.
          Fortes abraços do
                                                  Bilac.
         Recomende-me a Mme. Netto.

Olavo Bilac

Do livro: "Vida e poesia de Olavo Bilac", Fernando Jorge, introd. de Menotti del Picchia, 4ª ed., revista e ampliada, T. A. Queiroz Editor, 1992, SP

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